quinta-feira, 27 de novembro de 2008

Fernando Pessoa

Não sei quantas almas tenho.
Cada momento mudei.
Continuamente me estranho.
Nunca me vi nem acabei.
De tanto ser, só tenho alma.
Quem tem alma não tem calma.
Quem vê é só o que vê,
Quem sente não é quem é,

Atento ao que sou e vejo,
Torno-me eles e não eu.
Cada meu sonho ou desejo
É do que nasce e não meu.
Sou minha própria paisagem;
Assisto à minha passagem,
Diverso, móbil e só,
Não sei sentir-me onde estou.

Por isso, alheio, vou lendo
Como páginas, meu ser.
O que segue não prevendo,
O que passou a esquecer.
Noto à margem do que li
O que julguei que senti.
Releio e digo : "Fui eu ?"
Deus sabe, porque o escreveu.

domingo, 16 de novembro de 2008

A grande Lição

As sandálias do discípulo ressoavam surdamente nos degraus de pedra que levavam aos porões do velho mosteiro. Empurrou a pesada porta de madeira que cerrava os aposentos do ancião e custou a localizá-lo na densa penumbra, o rosto velado pelo capuz, sentado atrás de enorme escrivaninha onde, apesar de escuro, fazia anotações num grande livro, tão velho quanto ele. E o discípulo o inquiriu:
- Mestre qual o sentido da vida?
O idoso monge permanecendo em silêncio, apenas apontou um pedaço de pano, um trapo grosseiro no chão junto à parede e após, seu indicador ossudo e encarquilhado mostrou logo acima, no alto do aposento, o vidro da janela, opaco sob décadas de poeira e teias de aranha. O discípulo pegou o pano e subindo em algumas prateleiras de uma pesada estante forrada de livros conseguiu alcançar a vidraça, começando então a esfregá-la com vigor, retirando a sujeira que impedia sua transparência. O sol inundou o aposento, banhando com sua luz estranhos objetos, instrumentos raros e dezenas de papiros e pergaminhos com misteriosas anotações e signos cabalísticos. O discípulo, sem caber em si de contentamento, a fisionomia denotando o brilho da satisfação declarou:
- Entendi, mestre. Devemos nos livrar de tudo que obstrui nosso aprendizado; buscar retirar o pó dos preconceitos e as teias das opiniões que impedem que a luz do conhecimento nos atinja e só então poderemos enxergar as coisas com mais nitidez, partindo então para a evolução e o sucesso.
E assim, o jovem discípulo fez uma reverencia deixou o aposento, agora iluminado, a fim de dividir com os outros a lição recém aprendida.
O. velho monge, o rosto enrugado ainda encoberto pelo largo capuz, os raios do sol da manhã , agora o banhando com claridade a que desacostumara, viu o discípulo se afastando e deixou escapar um tênue sorriso.
- Mais importante do que aquilo que alguém mostra, é o que o outro enxerga...
Pensou ele.
e murmurando baixinho disse:
-Eu só queria que ele colocasse o pano no lugar de onde caiu.



O mais importante não é o que se ensina , mas o que se aprende.
proflorisvaldo.blogspot.com

sábado, 15 de novembro de 2008

Sete saberes Necessários à Educação

Morin, Edgar - Os sete Saberes Necessários à Educação do Futuro 3a. ed. - São Paulo - Cortez; Brasília, DF: UNESCO, 2001
Em 1999, a UNESCO solicitou ao filósofo Edgar Morin - nascido na França, em 1921 e um dos maiores expoentes da cultura francesa no século XX - a sistematização de um conjunto de reflexões que servissem como ponto de partida para se repensar a educação do século XXI.
Os sete saberes indispensáveis enunciados por Morin, objeto do presente livro:

- as cegueiras do conhecimento: o erro e a ilusão;
- os princípios do conhecimento pertinente;
- ensinar a condição humana;
- ensinar a identidade terrena;
- enfrentar as incertezas;
- ensinar a compreensão;
- a ética do gênero humano,
são eixos e, ao mesmo tempo, caminhos que se abrem a todos os que pensam e fazem educação e que estão preocupados com o futuro das crianças e adolescentes.
O texto de Edgar Morin tem o mérito de introduzir uma nova e criativa reflexão no contexto das discussões que estão sendo feitas sobre a educação para o Século XXI.
Aborda temas fundamentais para a educação contemporânea, por vezes ignorados ou deixados à margem dos debates sobre a política educacional.
Sua leitura levará à revisão das práticas pedagógicas da atualidade, tendo em vista a necessidade de situar a importância da educação na totalidade dos desafios e incertezas dos tempos atuais.
Seus capítulos - ou eixos - expõem a genialidade, clareza e simplicidade do filósofo Morin, num texto dedicado aos educadores, em particular, mas acessível a todos que se interessam pelos caminhos a trilhar em busca de um futuro mais humano, solidário e marcado pela construção do conhecimento.
I - As cegueiras do conhecimento: o erro e a ilusão
É impressionante que a educação que visa a transmitir conhecimentos seja cega ao que é conhecimento humano, seus dispositivos, enfermidades, dificuldades, tendências ao erro e à ilusão e não se preocupe em fazer conhecer o que é conhecer.
De fato, o conhecimento não pode ser considerado uma ferramenta "ready made", que pode ser utilizada sem que sua natureza seja examinada. Da mesma forma, o conhecimento do conhecimento deve aparecer como necessidade primeira, que serviria de preparação para enfrentar os riscos permanentes de erro e de ilusão, que não cessam de parasitar a mente humana. Trata-se de armar cada mente no combate vital rumo à lucidez.
É necessário introduzir e desenvolver na educação estudo das características cerebrais, mentais, culturais dos conhecimentos humanos, de seus processos e modalidades, das disposições tanto psíquicas quanto culturais que o conduzem ao erro ou à ilusão.

O calcanhar de Aquiles do conhecimento
A educação deve mostrar que não há conhecimento que não esteja, em algum grau, ameaçado pelo erro e pela ilusão. O conhecimento não é um espelho das coisas ou do mundo externo. Todas as percepções são, ao mesmo tempo, traduções e reconstruções cerebrais com base em estímulos ou sinais captados pelos sentidos. Resultam, daí, os inúmeros erros de percepção que nos vêm de nosso sentido mais confiável, a visão.
Ao erro da percepção acrescenta-se o erro intelectual
O conhecimento, como palavra, idéia, de teoria, é fruto de uma tradução/construção por meio da linguagem e do pensamento e, por conseguinte, está sujeito ao erro. O conhecimento comporta a interpretação, o que introduz o risco de erro na subjetividade do conhecedor, de sua visão de mundo e de seus princípios de conhecimento.
Daí os numerosos erros de concepção e de idéias que sobrevêm a despeito de nossos controles racionais. A projeção de nossos desejos ou de nossos medos e pás perturbações mentais trazidas por nossas emoções multiplicam os riscos de erro.
O desenvolvimento do conhecimento científico é poderoso meio de detecção de erros e de luta contra as ilusões. Entretanto, os paradigmas que controlam a ciência podem desenvolver ilusões, e nenhuma teoria científica está imune para sempre contra o erro. Além disso, o conhecimento científico não pode tratar sozinho dos problemas epistemológicos, filosóficos e éticos.
A educação deve se dedicar, por conseguinte, à identificação da origem de erros, ilusões e cegueiras.
Os erros podem ser mentais - pois nenhum dispositivo cerebral permite distinguir a alucinação da percepção, o sonho da vigília, o imaginário do real, o subjetivo do objetivo. A própria memória é fonte de erros inúmeros. Nossa mente tende, inconscientemente, a selecionar as lembranças convenientes e eliminar as desagradáveis. Há também falsas lembranças, fruto de pura ilusão.
Os erros podem ser intelectuais - pois os sistemas de idéias (teorias, doutrinas, ideologias) não apenas estão sujeitas ao erro, como protegem os erros possivelmente contidos em seu contexto.
Os erros da razão: a racionalidade é a melhor proteção contra o erro e a ilusão. Mas traz em seu seio uma possibilidade de erro e de ilusão quando se perverte, se transforma em racionalização. A racionalização, nutrindo-se das mesmas fontes da racionalidade, constitui grande fonte de erros e ilusões. A racionalidade não é uma qualidade de que são dotadas algumas pessoas - técnicos e cientistas - e outras não. A racionalidade também não é monopólio ou uma qualidade da civilização ocidental. Mesmo sociedades arcaicas podem apresentar elementos de racionalidade em seu funcionamento. Começamos a nos tornar verdadeiramente racionais quando reconhecemos a racionalização até em nossa racionalidade e reconhecemos os próprios mitos, entre os quais o mito de nossa razão toda-poderosa e do progresso garantido.
É necessário reconhecer, na educação do futuro, um princípio de incerteza racional: pois a racionalidade corre risco constante, caso não mantenha vigilante autocrítica quanto a cair na ilusão racionalizadora. E a verdadeira racionalidade deve ser não apenas teórica e crítica, mas também autocrítica.
Os erros paradigmáticos - os modelos explicativos - os paradigmas - também são sujeitos a erros - de concepção e de interpretação de conceitos. O paradigma cartesiano, por exemplo - mola mestra do desenvolvimento científico e cultural do Ocidente - se fundamenta em contrastes binários: sujeito/objeto, alma/corpo, espírito/matéria, qualidade/quantidade, sentimento/razão,existência/essência, certo/errado, bonito/feio, etc. - não encontram, no mundo de hoje, a fundamentação que parecia possuir no início do século XX. O paradigma - como o cartesiano - mostra alguma coisa e esconde outras - podendo, portanto, elucidar e cegar, revelar e ocultar. É no seu seio que se esconde o problema -chave do jogo da verdade e do erro.
O "imprinting" e a normalização
"Imprinting" é o termo proposto por Konrad Lorenz para dar conta da marca indelével imposta pelas primeiras experiências do animal recém nascido. O 'imprinting" cultural marca os humanos desde o nascimento, primeiro com o elo da cultura familiar; depois da cultura da escola, prosseguindo pela universidade e na vida profissional.
A normalização - forma de estandartização das consciências - é um processo social (conformismo) que elimina o poder da pessoa humana de contestar o "imprinting".
A noologia: possessão
O autor cita Marx, ao dizer "os produtos do cérebro humano têm o aspecto de seres independentes, dotados de corpos particulares em comunicação com os humanos e entre si". Edgar Morin está se referindo às crenças e idéias - muitas vezes reificadas, corporificadas, a ponto de afirmar que "as crenças e idéias não são somente produtos da mente, mas também seres mentais que têm vida e poder; e assim, podem possuir-nos". O homem, na visão do autor, é prisioneiro, por vezes, de suas crenças e idéias, nos dias de hoje, assim como o foi, anteriormente, prisioneiro dos mitos e superstições.
O inesperado
O inesperado, no dizer de Morin, "surpreende-nos"; nós nos acostumamos de maneira segura com nossas teorias, crenças e idéias, sem deixar lugar para o acolher o "novo". Entretanto, o 'novo" brota sem parar...
Quando o inesperado se manifesta, é preciso ser capaz de rever nossas teorias e idéias, em vez de deixar o fato novo entrar à força num ambiente (ou instância, ou teoria) incapaz de recebê-lo.

A incerteza do conhecimento
É preciso destacar, em qualquer educação, as grandes interrogações sobre nossas possibilidades de conhecer. Pôr em prática as interrogações constitui o oxigênio de qualquer proposta de conhecimento. E o conhecimento permanece como uma aventura para a qual a educação deve fornecer o apoio indispensável.
II - Os princípios do conhecimento pertinente
Existe um problema capital, sempre ignorado, que é o da necessidade de promover o conhecimento capaz de aprender problemas globais e fundamentais para neles inserir os conhecimentos parciais e locais.
A supremacia do conhecimento fragmentado de acordo com as disciplinas impede freqüentemente de operar o vínculo entre as partes e a totalidade, e deve ser substituída por um modo de conhecimento capaz de apreender os objetos em seu contexto, sua complexidade, seu conjunto.
É necessário desenvolver a aptidão natural do espírito humano para situar todas essas informações em um contexto e um conjunto. É preciso ensinar os métodos que permitam estabelecer as relações mútuas e as influências recíprocas entre as partes e o todo em um mundo complexo.
Da pertinência no conhecimento
A pertinência do mundo enquanto mundo é uma necessidade, ao mesmo tempo, intelectual e vital.
É o problema universal de todo cidadão do novo milênio: como ter acesso às informações e organizá-las? Como perceber e conceber o Contexto, o Global (relação todo/partes) o Multidimensional, o Complexo?
Para articular e organizar os conhecimentos e, assim, reconhecer e conhecer os problemas do mundo, é necessária a reforma do pensamento. Entretanto, essa reforma não é programática, mais sim, paradigmática - é questão fundamental da educação, já que se refere à nossa aptidão para organizar o conhecimento.
Esse é o grande problema a ser enfrentado pela educação do futuro - tornar evidentes:
- o contexto: o conhecimento das informações ou dados isolados é insuficiente; é preciso situar as informações e dados em seu contexto para que adquiram sentido;
- o global (relação todo/partes); é mais que o contexto, é o conjunto das diversas partes ligadas a ele de modo inter-retroativo ou organizacional; assim, uma sociedade é mais que um contexto: é o todo organizador de que fazemos parte;
- o multidimensional: sociedades ou seres humanos são unidades complexas, multidimensionais; assim, o ser humano é, ao mesmo tempo, biológico, psíquico, afetivo, social, racional; a sociedade comporta dimensões histórica, econômica, sociológica, religiosas; o conhecimento pertinente deve reconhecer esse caráter multidimensional e nesse inserir todos os dados a ele pertinentes.
- O complexo: há complexidade quando elementos diferentes são inseparáveis constitutivos do todo e há um tecido independente, interativo e inter-retroativo entre o objeto de conhecimento e seu contexto, partes e todo, todo e partes, partes em si; assim, complexidade é a união entre unidade e multiplicidade.
A inteligência geral
O desenvolvimento de aptidões gerais da mente permite melhor desenvolvimento das competências particulares ou especializadas.
Quanto mais poderosa é a inteligência geral, maior é sua faculdade para tratar de problemas especiais. A compreensão de dados particulares também necessita da ativação da inteligência geral, que opera e organiza a mobilização dos conhecimentos de conjunto de cada caso particular.
A educação deve favorecer a aptidão natural da mente em formular e problemas essenciais e, de forma correlata, estimular o uso total da inteligência geral. Este uso total pede o livre exercício da curiosidade, a faculdade mais expandida e a mais viva durante a infância e a adolescência, que com freqüência a instrução extingue e que, ao contrário, se trata de estimular, caso esteja adormecida, despertar.
A educação do futuro, em sua missão de promover a inteligência geral dos indivíduos, deve ao mesmo tempo utilizar os conhecimentos existentes, superar as antinomias decorrentes do progresso nos conhecimentos especializados e identificar a falsa racionalidade.
A antinomia - para Morin, nos dias atuais, os sistemas de ensino portam antinomias - contradições - criando e alimentando disjunções entre as ciências e as humanidades, assim como a separação das ciências em disciplinas hiperespecializadas, fechadas em si mesmas. Os problemas fundamentais da humanidade e os problemas globais estão ausentes das ciências disciplinares; o enfraquecimento da percepção global conduz ao enfraquecimento da responsabilidade (cada um passa a responder somente por sua tarefa especializada), assim como ao enfraquecimento da solidariedade (as pessoas não sentem mais os vínculos com seus concidadãos).
Os problemas essenciais
Disjunção e especialização fechada - hiper-especialização impede tanto a percepção do global (que ela fragmenta em parcelas) quanto do essencial (que ela dissolve).
Redução e disjunção - o princípio da redução (limitar o conhecimento do todo ao conhecimento de suas partes) leva naturalmente a restringir o complexo ao simples. Aplica às complexidades vivas e humanas a lógica mecânica e determinista da máquina artificial. Como nossa educação sempre nos ensinou a separar, compartimentar, isolar, e não unir os conhecimentos, o conjunto deles constitui um quebra-cabeças ininteligível.
A inteligência compartimentada, parcelada, mecanicista, reducionista, enfim - disjuntiva - rompe o complexo do mundo em fragmentos disjuntos, fraciona os problemas, separa o que está unido, torna unidimensional o multidimensional. É uma inteligência míope que acaba por ser normalmente cega. Reduz as possibilidades de julgamento corretivo ou da visão a longo prazo. Assim, quanto mais a crise progride, mais progride a incapacidade de pensar a crise; quanto mais os problemas se tornam multidimensionais, maior a incapacidade de pensar sua multidimensionalidade; quanto mais os problemas se tornam planetários, mais eles se tornam impensáveis.

A falsa racionalidade - ou seja, a racionalização abstrata, triunfa hoje em dia, por toda a parte, na forma do pensamento tecnocrático - incapaz de compreender o vivo e o humano aos quais se aplica, acreditando-se ser o único racional. O século XX viveu sob o domínio da pseudo-racionalidade que presumia ser a única racionalidade, mas atrofiou a compreensão, a reflexão e a visa em longo prazo. Sua insuficiência para lidar com os problemas mais graves constituiu um dos mais graves problemas para a humanidade. Daí, o paradoxo: o século XX produziu avanços gigantescos em todas as áreas do conhecimento científico, assim como no campo da técnica. Ao mesmo tempo, produziu nova cegueira para os problemas globais, fundamentais e complexos, gerando inúmeros erros e ilusões.
III - Ensinar a condição humana
O ser humano é a um só tempo, físico, biológico, psíquico, cultural, social, histórico. Esta unidade complexa na natureza humana é totalmente desintegrada na educação por meio das disciplinas, tendo-se tornado impossível aprender o que significa ser humano. É preciso restaurá-la, de modo que cada um, onde quer que se encontre, tome conhecimento e consciência, ao mesmo tempo, de sua identidade complexa e de sua identidade comum a todos os outros humanos.
Desse modo, a condição humana deveria ser o objeto essencial de todo o ensino. É possível, como base nas disciplinas atuais, reconhecer a unidade e a complexidade humanas, reunindo e organizando conhecimentos dispersos nas ciências da natureza, nas ciências humanas, na literatura e na filosofia, pondo em evidência o elo indissolúvel entre a unidade e a diversidade de tudo que é humano.
Enraizamento/desenvolvimento do ser humano
A educação do futuro deverá ser o ensino primeiro e universal, centrado na condição humana. Conhecer o humano é, antes de mais nada, situá-lo no universo, e não separa-lo dele. Todo o conhecimento deve contextualizar seu objeto para ser pertinente; "quem somos?" é inseparável de "onde estamos", "de onde viemos', para "para onde vamos?". Interrogar nossa condição humana implica questionar nossa posição no mundo. Para a educação do futuro, é necessário promover grande remembramento (consolidação) dos conhecimentos oriundos das ciências naturais, a fim de situar a condição humana no mundo, dos conhecimentos derivados das ciências humanas para colocar em evidência a multidimensionalidade e a complexidade humanas.
O humano do humano
O homem é um ser a um só tempo plenamente biológico e plenamente cultural, que traz em si a unidualidade originária. É super e hipervivente: desenvolveu de modo surpreendente as potencialidades da vida. Exprime de maneira hipertrofiada as qualidades egocêntricas e altruístas do indivíduo, alcança paroxismos de vida em êxtases e na embriagues, ferve de ardores orgiásticos e orgásmicos e é nessa hipervitalidade que o "Homo Sapiens" é também "Homo Demens".
O homem e o humano se encontram anelados a três circuitos fundamentais para sua vida enquanto ser e enquanto pessoa:
- o circuito cérebro/mente/cultura;

- o circuito razão/afeto/pulsão; e

- o circuito indivíduo/sociedade/espécie.
Todo desenvolvimento verdadeiramente humano significa o desenvolvimento conjunto das autonomias individuais, das participações comunitárias e do sentimento de pertencer à espécie humana.
"Unitas multiplex": unidade e diversidade humana
Há uma unidade humana; e há uma diversidade humana. A unidade não está apenas nos traços biológicos da espécie; a diversidade não está apenas nos traços psicológicos, culturais e sociais. Existem outras unidade e diversidades perfilhando as características do ser humano em "ser humano".
Cabe à educação do futuro cuidar para que a idéia de unidade da espécie humana não apague a idéia de diversidade e que a diversidade não apague a unidade. A educação deverá ilustrar este princípio de unidade/diversidade em todas as esferas do conhecimento.
IV - Ensinar a identidade terrena
O destino planetário do gênero humano é outra realidade até agora ignorada pela educação. O conhecimento dos desenvolvimentos da era planetária, que tendem a crescer no século XXI, e o reconhecimento da identidade terrena, que se tornará cada vez mais indispensável a cada um e a todos, devem converter-se em um dos principais objetos da educação.
Convém ensinar a história da era planetária, que se inicia com o estabelecimento da comunicação entre todos os continentes no século XVI, e mostrar como todas as partes do mundo se tornaram solidárias, sem, contudo, ocultar as opressões e a dominação que devastaram a humanidade e que ainda não desapareceram. Será preciso indicar o complexo de crise planetária que marca o século XX, mostrando que todos os seres humanos, confrontados de agora em diante aos mesmos problemas de vida e de morte, partilham um destino comum.
A contribuição das contracorrentes
O século XX deixou como herança contracorrentes regeneradoras. Freqüentemente, na história, contracorrentes suscitadas em reação ás correntes dominantes podem se desenvolver e mudar o curso dos acontecimentos. Devemos considerar, como movimentos importantes e atuantes:
- a contracorrente ecológica que, com o crescimento das degradações e o surgimento de catástrofes técnicas/industriais, só tende a aumentar;
- a contracorrente qualitativa que, em reação à invasão do quantitativo e da uniformização generalizada, se apega à qualidade em todos os campos, a começar pela qualidade de vida;
- a contracorrente da resistência à vida prosaica puramente utilitária, que se manifesta pela busca da vida poética, dedicada ao amor, à admiração, à paixão, à festa;
- a contracorrente de resistência à primazia do consumo padronizado, que se manifesta de duas maneiras opostas: uma, pela busca da intensidade vivida (consumismo); a outra, pela busca da frugalidade e temperança (minimalismo);
- a contracorrente, ainda tímida, de emancipação em relação à tirania onipresente do dinheiro, que se busca contrabalançar por relações humanas e solidárias, fazendo retroceder o reino do lucro;
- a contracorrente, também tímida, que, em reação ao desencadeamento da violência, nutre éticas de pacificação das almas e das mentes.
V - Enfrentar as incertezas
As ciências permitiram que adquiríssemos muitas certezas, mas igualmente revelaram, ao longo do século XX, inúmeras zonas de incerteza. A educação deveria incluir o ensino das incertezas que surgiram nas ciências físicas (microfísica, termodinâmica, cosmologia), nas ciências da evolução biológica e nas ciências históricas.
Será preciso ensinar princípios de estratégia que permitiriam enfrentar os imprevistos, o inesperado e a incerteza, e modificar seu desenvolvimento em virtude das informações adquiridas ao longo do tempo. É preciso aprender a navegar em um oceano de incertezas em meio a arquipélagos de certeza.
A fórmula do poeta grego Eurípedes, que data de vinte e cinco séculos, nunca foi tão atual: "O esperado não se cumpre, e ao inesperado um deus abre o caminho". O abandono das concepções deterministas da história humana que acreditavam poder predizer nosso futuro, o estudo dos grandes acontecimentos e desastres de nosso século, todos inesperados, o caráter doravante desconhecido da aventura humana devem-nos incitar a preparar as mentes para esperar o inesperado, para enfrenta-lo. É necessário que todos os que se ocupam da educação constituam a vanguarda ante a incerteza de nossos tempos.
VI - Ensinar a compreensão
A compreensão é a um só tempo meio e fim da comunicação humana. Entretanto, a educação para a compreensão está ausente no ensino. O planeta necessita, em todos os sentidos, de compreensão mútua. Considerando a importância da educação para a compreensão, em todos os níveis educativos e em todas as idades, o desenvolvimento da compreensão pede a reforma das mentalidades. Esta deve ser a obra para a educação do futuro.
A compreensão mútua entre os seres humanos, quer próximos, quer estranhos, é daqui para a frente vital para que as relações humanas saiam de seu estado bárbaro de incompreensão. Daí decorre a necessidade de estudar a incompreensão a partir de suas raízes, suas modalidades e seus efeitos. Este estudo é tanto mais necessário porque enfocaria não os sintomas, mas as causas do racismo, da xenofobia, do desprezo. Constituiria, ao mesmo tempo, uma das bases mais seguras da educação para a paz, à qual estamos ligados por essência e vocação.
As duas compreensões
Há duas formas de compreensão: a compreensão intelectual ou objetiva e a compreensão humana intersubjetiva. Compreender significa intelectualmente apreender em conjunto, comprehendere, abraçar junto (o texto e o seu contexto, as partes e o todo, o múltiplo e o uno). A compreensão intelectual passa pela inteligibilidade e pela explicação. Explicar é considerar o que é preciso conhecer como objeto e aplicar-lhe todos os meios objetivos de conhecimento. A explicação é, bem entendido, necessária para a compreensão intelectual ou objetiva.
Mas a compreensão humana vai além da explicação. A explicação é bastante para a compreensão intelectual ou objetiva das coisas anônimas ou materiais. A compreensão humana comporta um conhecimento de sujeito a sujeito. Por conseguinte, se vemos uma criança chorando, nós a compreendemos, não pelo grau de salinidade de suas lágrimas, mas por buscar em nós mesmos nossas aflições infantis, identificando-a conosco e identificando com ela. Compreender inclui, necessariamente, um processo de empatia, de identificação e de projeção. Sempre intersubjetiva, a compreensão pede abertura, simpatia e generosidade.
Educação para os obstáculos à compreensão
Há múltiplos obstáculos exteriores à compreensão intelectual:
- o "ruído" que interfere na transmissão da informação, criando o mal-entendido e ou não-entendido;
- a polissemia de uma noção que, enunciada em um sentido, é entendida de outra forma;
- há a ignorância dos ritos e costumes do outro, especialmente os ritos de cortesia, o que pode levar a se ofender inconscientemente ou desqualificar a si mesmo perante o outro (diversidade cultural);

- existe a incompreensão dos valores imperativos propagados no seio de outra cultura - respeito aos idosos, crenças religiosas, obediência incondicional das crianças, ou, ao contrário, em nossa sociedade, o culto ao indivíduo e o respeito às liberdades;
- há a incompreensão dos imperativos éticos próprios a uma cultura, o imperativo da vingança nas sociedades tribais, o imperativo da lei nas sociedades evoluídas;
- existe a impossibilidade, enquanto visão de mundo, de compreender as idéias e os argumentos de outra visão de mundo, assim como uma ideologia/filosofia compreender outra ideologia/filosofia;
- existe, enfim, a impossibilidade de compreensão de uma estrutura mental em relação a outra.
A ética da compreensão
É a arte de viver que nos demanda, em primeiro lugar, compreender de modo desinteressado. Demanda grande esforço, pois não pode esperar nenhuma reciprocidade: aquele que é ameaçado de morte por um fanático compreende porque o fanático quer mata-lo, sabendo que este jamais o compreenderá. A ética da compreensão pede que compreenda a incompreensão.

VII - A ética do gênero humano
"El camino se hace al andar" (Antonio Machado)
A educação deve conduzir à "antropo-ética", levando em conta o caráter ternário da condição humana, que é ser ao mesmo tempo indivíduo/sociedade/espécie. Nesse sentido, a ética indivíduo/espécie necessita do controle mútuo da sociedade pelo indivíduo e do indivíduo pela sociedade, ou seja, a democracia; a ética indivíduo/espécie convoca, ao século XXI, a cidadania terrestre.
A ética não poderia ser ensinada por meio de lições de moral. Deve formar-se nas mentes com base na consciência de que o humano é, ao mesmo tempo, indivíduo, parte da sociedade, parte da espécie. Carregamos em nós esta tripla realidade. Desse modo, todo desenvolvimento verdadeiramente humano deve compreender o desenvolvimento conjunto das autonomias individuais, das participações comunitárias e da consciência de pertencer à espécie humana.
Partindo disso, esboçam-se duas grandes finalidades ético-políticas do novo milênio: estabelecer uma relação de controle mútuo entre a sociedade e os indivíduos pela democracia e conceber a Humanidade como comunidade planetária. A educação deve contribuir não somente para a tomada de consciência de nossa "Terra-Pátria", mas também permitir que esta consciência se traduza em vontade de realizar a cidadania terrena.
Não possuímos as chaves que abririam as portas de um futuro melhor. Não conhecemos o caminho traçado. Podemos, porém, explicitar nossas finalidades: a busca da hominização na humanização, pelo acesso à cidadania terrena.

sexta-feira, 7 de novembro de 2008

Resenha: Andy Hargreaves - O Ensino na Sociedade do Conhecimento: A educação na era da insegurança*


Por Francisco Valente
22 de abril de 2006
Hargreaves faz uma crítica severa às condições sociais e de trabalho impostas à população pelo capitalismo selvagem que caracterizou a industrialização européia nos séculos 18 e 19 e, por conseqüência, critica também o modelo capitalista atual, marcado pelos apelos que faz ao consumismo desenfreado utilizando para isso, a mídia e a telemática.

Introdução

Vivemos numa sociedade dinâmica. A partir desta constatação, Andy Hargreaves, neste texto, examina o significado da sociedade do conhecimento, sua importância e seu sentido para os professores de hoje.
São alguns de seus questionamentos: Como ensinamos os jovens a trabalhar e prosperar a partir da sociedade do conhecimento? Como os protegemos (aos jovens) contra o ritmo frenético da sociedade do conhecimento e seus efeitos descontrolados?
As sociedades do conhecimento necessitam das escolas para tornar-se sociedades aprendentes criativas e solidárias e o autor apresenta alguns exemplos que servem de inspiração para isso.
As escolas de hoje devem servir e moldar um mundo no qual pode haver grandes oportunidades de melhorias econômicas se as pessoas puderem aprender a trabalhar de forma mais flexível, investir em sua segurança financeira futura, reciclar suas habilidades, ir reencontrando seu lugar enquanto a economia se transforma ao seu redor e valorizar o trabalho criativo e cooperativo.

As noções de sociedade aprendente/organização aprendente já foram abordadas por Hargreaves em livro anterior, escrito em parceria com Michael Fullan1 .
Nesse livro, fala em escola total e professor total, ambiente e profissional voltados para a cultura cooperativa, onde a interdependência forma o cerne das relações entre professores, fazendo com que cada um se sinta parte do grupo e de um trabalho em equipe. Nesse texto, ainda, dá como exemplo de “escola aprendente” aquela focada em novos resultados, voltada menos ao ensino tradicional e mais em termos do ensino para a compreensão e desempenho num mundo em transformação. Certamente, um mundo onde a sociedade do conhecimento torna-se uma verdadeira sociedade de aprendizagem.


Capítulo 1. O ensino para a sociedade do conhecimento: educar para a inventividade.

Hargreaves afirma que a sociedade do conhecimento processa informação de forma a maximizar a aprendizagem, estimular a criatividade e a inventividade, desenvolver a capacidade de desencadear as transformações e enfrentá-las.

“Ensinar é uma profissão paradoxal. Entre todos os trabalhos que são, ou aspiram a ser profissões, apenas do ensino se espera que gere habilidades e as capacidades humanas que possibilitarão a indivíduos e organizações sobreviver e ter êxito na sociedade do conhecimento nos dias de hoje. Dos professores, mais do que qualquer outra pessoa, espera-se que construam comunidades de aprendizagem, criem a sociedade do conhecimento e desenvolvam capacidades para inovação, flexibilidade e o compromisso com a transformação, essenciais à prosperidade econômica. Ao mesmo tempo, os professores devem também mitigar e combater muitos dos imensos problemas criados pelas sociedades do conhecimento, tais como o consumismo excessivo, a perda da noção de comunidade e o distanciamento crescente entre ricos e pobres. No atingimento desses objetivos simétricos reside seu paradoxo profissional. A educação – e consequentemente, escola e professores - deve estar a serviço da criatividade e da inventividade.


Capítulo 2. O ensino para além da sociedade do conhecimento: do valor do dinheiro aos valores do bem.

Trata dos custos da economia do conhecimento, isto é, de um bem público do qual ela não tem capacidade de tomar conta. A economia do conhecimento leva as pessoas a colocarem o interesse próprio antes do bem social, a se entregaram ao consumo em vez de se envolver com a comunidade, a desfrutar do trabalho temporário em equipe mais do que desenvolver as emoções de longo prazo da lealdade e perseverança que sustentam os compromissos duradouros da vida coletiva. A economia do conhecimento é necessariamente sedenta de lucros. Deixada por conta própria, drena os recursos do Estado, causando a erosão das instituições da vida pública, incluindo até mesmo as escolas. Em sua expressão mais radical (o fundamentalismo de mercado), a economia do conhecimento abre fendas entre ricos e pobres, no interior das nações e entre elas, criando raiva e desespero entre os excluídos.

Capítulo 3. O ensino apesar da sociedade do conhecimento I: o fim da inventividade.
(com Michael Baker e Martha Foote)

Capítulo 4. O ensino apesar da sociedade do conhecimento II: a perda da integridade.
(com Shawn Moore e Dean Fink)

Os capítulos 3 e 4 (I e II) procuram demonstrar que os imperativos fundamentais da reforma da educação não estão preparando as pessoas para a economia do conhecimento nem para a vida pública além dela.
Vale-se, para isso, de evidências oriundas dos estados de Nova York, nos Estados Unidos, e de Ontário, no Canadá.
Apresentam dados de pesquisas e entrevistas feitas em escolas de nível médio demonstrando que os padrões curriculares degeneraram para uma padronização insensível. Nas escolas com desempenho mais elevado isso mostrou-se irrelevante; porém, nas escolas que têm grandes quantidades de alunos de educação especial ou profissionalizante, níveis elevados nunca são atingíveis. Em lugar de graduação, os alunos recebem degradação e seus professores são lançados em espetáculos de fracasso e vergonha, erguendo diques de frustração que certamente explodirão quando imensas quantidades de alunos não conseguirem se formar.

“A reforma educacional padronizada (isto é, que não leva em conta as peculiaridades, necessidades e expectativas da clientela escolar) tem tanto valor para uma economia do conhecimento vigorosa em uma sociedade civil forte quanto gafanhotos para uma plantação de milho”.

Capítulo 5. A escola da sociedade do conhecimento: uma entidade em extinção.
(com Corrie Giles)

Trata das exceções. Descreve uma escola que conseguiu se construir como organização de aprendizagem e comunidade de aprendizagem profissional.
A escola promove equipes nesse sentido, envolve a todos no contexto geral de seus rumos, utiliza a tecnologia para promover a aprendizagem pessoal e organizacional, baseia as decisões em dados compartilhados e envolve os pais na definição dos rumos dos estudantes quando estes deixam a escola. É uma comunidade de cuidado e solidariedade, bem como uma comunidade de aprendizagem que dá à família, aos relacionamentos e a uma preocupação cosmopolita com os outros no mundo. Mas essa escola do do conhecimento também sofre ameaças de ser submetida a reformas-padrão insensíveis de ensino.


Capítulos 6. Para além da padronização: comunidades de aprendizagem profissional ou seitas de treinamento para o desempenho?

Capítulo 7. O futuro do ensino na sociedade do conhecimento:repensar o aprimoramento, eliminar o empobrecimento.

Os capítulos 6 e 7 buscam um caminho para sair desse impasse (aprendizagem profissional ou seitas de treinamento para o desempenho?) O primeiro (6) analisa as políticas de países fora da América do Norte e distritos no sub-continente que experimentaram anos de padronização e agora compreendem a urgência de ir além dela, especialmente quanto acontece uma crise de recrutamento de professores e uma necessidade de atrair e manter pessoas capazes na profissão.
Em alguns locais existe autonomia, flexibilidade e comunidade profissional para professores que têm bom desempenho. Todavia, escolas em comunidades e em países mais pobres estão sendo sujeitadas a intervenções tendendo à padronização, principalmente nas áreas de alfabetização e aritmética, assumindo a forma do que o autor denomina “seitas de treinamento para o desempenho” e que oferecem apoio intensivo ao ensino somente em aspectos considerados “básicos' do currículo. A tendência, assim, expõe Hargreaves, é termos cada vez mais uma divisão entre ricos e pobres, aqueles com acesso a um ensino diferenciado, com mais recursos de toda ordem e estes (os pobres) sujeitados a uma escola com estrutura curricular padronizada e não atendente às peculiaridades, necessidades e expectativas da clientela.

O Capítulo 7. se posiciona contra o “apartheid “ (apartamento) do desenvolvimento profissional e do aprimoramento das escolas, questionando um mundo e um sistema educacional que dividem aqueles que aprendem como criar uma sociedade do conhecimento altamente especializada daqueles que apenas aprendem como servi-la, por meio de tarefas de nível inferior nas indústrias de consumo e hospitalidade.

Conclusão

Como conclusão, Hargreaves preconiza, como tarefa essencial, redesenhar a melhoria escolar a partir de linhas de desenvolvimento, de forma a fazer com que a comunidade profissional esteja disponível a todos, e por fim ao empobrecimento educacional e social que prejudica qualquer capacidade de avanço que muitas nações e comunidades possam ter.
Diz ainda que a busca da melhoria não constitui um substituto para o fim da pobreza, e ambas têm de ser conduzidas conjuntamente. Essa deveria ser uma das missões sociais e profissionais fundamentais da reforma educacional no século XXI, um de seus grandes projetos de inventividade social.
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*Andy Hargreaves - O Ensino na Sociedade do Conhecimento: A educação na era da insegurança - (2004) Porto Alegre (RS): Artmed Editora.

1 Fullan, Michael/Hargreaves, Andy (2000) A Escola como Organização Aprendente (buscando uma educação de qualidade), Porto Alegre:Artmed Editora

terça-feira, 4 de novembro de 2008

INTELIGÊNCIAS MÚLTIPLAS – A TEORIA NA PRÁTICA
HOWARD GARDNER



“Que mundo é este que nos recebe”?
Como são as pessoas? O que é a natureza?
Quem sou eu? Assim são as crianças, ávidas.
pelas descobertas. Assim diante de toda essa
curiosidade, pela surpresa e pela alegria,
as crianças abrem-se como girassóis, receptivas
a tudo e a todos, buscando a riqueza da luz.
Ao recebê-las, o que precisamos é redescobrir
com elas, o ser poético, a espontaneidade
a capacidade de filosofar sobre as coisas
“e reconhecer suas diferenças e peculiaridades.”


Cadernos Pedagógicos – OMEP
Introdução/volume 1



Entre os pensadores da Educação destacamos Howard Gardner, psicólogo americano, professor de Cognição e Educação e integrante do Projeto Zero – grupo de pesquisa em cognição humana, mantido pela Universidade de Harvard. Professor de Neurologia na Escola de Medicina da Universidade de Boston. Entre 18 livros escritos, destacamos Estruturas da Mente – Teoria das Inteligências Múltiplas: A Teoria na Prática, a criança pré-escolar como pensa e como a escola pode ensiná-la.
Basicamente o que esta teoria busca evidenciar, são as inteligências múltiplas que todas as pessoas possuem.
Fundamentado em pesquisas realizadas ao longo dos anos e de muita experiência com a educação, Gardner concluiu que existem sete espectros de inteligências a comandar a mente humana. Coloca como ponto relevante ao tratar das I.M, que todos nós temos tipos diferentes de mente, pensamos e agimos diferentemente.Portanto sugere aos educadores que ao se dirigirem à mente de cada criança, isto deva ser feito de forma a entendê-la em suas peculiaridades.Isso porque as crianças têm mentes diferentes umas das outras e por este motivo, não podemos compará-las e nem nivelar um programa pedagógico pela média dos comportamentos, das reações e das habilidades.
Muitos dos programas educacionais, atualmente já se baseiam nos princípios desta teoria, pois são programas que trazem significativas inovações para o currículo escolar, para o sistema de avaliação e na utilização de diferentes recursos a serem usados no desenvolvimento da aprendizagem das crianças.

Em síntese, para Gardner, existem sete inteligências, que podem ser resumidas desse modo:

• Inteligência lógico-matemática: traduzida na capacidade de realizar operações matemáticas e de analisar problemas com lógica. Matemáticos e cientistas têm essa capacidade privilegiada

• Inteligência lingüística: habilidade de aprender línguas e de usar a língua falada e escrita, para expressar-se e atingir objetivos. Advogados, escritores e locutores a exploram bem.

• Inteligência espacial: capacidade de reconhecer e de manipular uma situação espacial, ampla ou restrita. É importante tanto para navegadores, como para cirurgiões ou escultores.

• Inteligência físico-cinestésica: capacidade em usar o corpo para a solução de problemas ou a fabricação de produtos. Dançarinos, atletas, cirurgiões ou mecânicos, valem-se dela.

• Inteligência interpessoal: é traduzida pela capacidade de entender as intenções e os desejos dos outros e de se relacionar bem. Inclui-se aqui, os professores. É necessária para vendedores, líderes religiosos, políticos.

• Inteligência intrapessoal: seria a capacidade de auto-conhecimento, onde estariam incluídos, suas aspirações e o modo como usar suas informações, para alcançar objetivos pessoais.

• Inteligência musical: disposição inata para atuação, apreciação e composição de padrões musicais.

Gardner abre novos caminhos para a educação, onde a Escola e os professores devam considerar as crianças por inteiro e valorizar outras formas de demonstrarem competências e habilidades diversas.
Diante das idéias centrais desta teoria, poder-se-ia dizer que Howard Gardner em seu livro I.M., possibilita aos educadores a descoberta e o desenvolvimento de talentos?
É importante salientar que temos sim, mais de um tipo de inteligência, mas que alguma delas se destaca. Podemos perceber isso através do exemplo de Daiane dos Santos, nossa ginasta maior, que tem como prioridade em sua mente a inteligência físico-cinestésica, que é o que mais se destaca, é o seu talento. Porém os outros tipos de inteligências também se manifestam, porque ela também faz operações matemáticas e usa as linguagens para se comunicar, entre outras.
Em nosso entender, quando Gardner nomeia os tipos de inteligências com suas peculiaridades, está abrindo possibilidades de centrar a escola do futuro, no indivíduo, valorizando suas aptidões, suas habilidades, seus talentos.
O professor, ao atuar nessa perspectiva com seus alunos, desde a infância, abrirá caminhos que oportunizem incentivar e estimular o surgimento de talentos nas crianças, respeitando suas diferentes formas de agir e de ser.
Em sua obra I.M. Gardner relaciona a inteligência à criatividade, ao gênio, à prodigiosidade, à perícia e a outras tantas realizações mentais desejáveis.
Essa ampla variedade de inteligências humanas conduz a uma nova visão de educação que ele chama de “educação centrada no indivíduo”.
Ainda complementando a teoria, Gardner considera, além do trabalho educacional que vai desde o desenvolvimento de currículos, até a formação de professores - seu principal foco tem sido a criação de novas formas de a inteligência, pois permitem uma observação objetiva e direta da avaliação. Estas formas, que vão além dos testes padronizados, são justas para funcionamento das inteligências. Desse modo a estratégia de avaliação, promove ainda a auto-avaliação, o que possibilita que o indivíduo continue a aprender fora da escola.
Quando o autor apresenta “noções de contextualização” e de “inteligências distribuídas”, quer significar uma ampliação da inteligência que vá além da pele do indivíduo. Tais assertivas indicam formas de demonstrar, que nossas capacidades intelectuais são intimamente determinadas pelos contextos em que estamos inseridos e pelos recursos humanos e materiais de que dispomos.
Também são considerados novos tipos de ambientes, como museus, locais de trabalho, através de objetivos e planos pedagógicos mais desafiadores e que ao mesmo tempo envolvam as crianças na busca da solução de problemas e no desenvolvimento da criatividade.


Fonte para consulta:

INTELIGÊNCIAS MÚLTIPLAS: A TEORIA NA PRÁTICA
GARDNER HOWARD – 1995 Editora Artes Médicas
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