quinta-feira, 31 de julho de 2008

Eugenio Mussak
Meta Competência
Uma Nova Visão do trabalho e da realização Pessoal
Desenvolvimento integral do ser humano
Editora Gente 6 edição 2003 São Paulo

Conhecimento.
Principal vantagem competitiva

1. O conhecimento como produto
Você já leu, e/ou com certeza já ouviu, que vivemos a Era do Conhecimento ou, como referem alguns, a sociedade do conhecimento. Eras são períodos de tempo marcados por uma forte característica Sociedades são agrupamentos que apresentam traços culturais comuns. Tanto em um sentido quanto em outro, convivemos com fenômeno do conhecimento como nunca antes havíamos experimentado.
Competência é o produto entre conhecimento, habilidade e atitude. Conhecimento não é, portanto, sinônimo de competência, mas é, sem dúvida, o componente inicial e o que mais exige reposição, em função de sua volatilidade atual. Há um novo tipo de trabalhador surgin­do, o chamado "trabalhador do conhecimento", expressão criada por Peter Drucker (em inglês, knowledge worker). Esse trabalhador não é apenas aquele cuja atividade tem o conhecimento como produto, mas todos os profissionais que vêem sua ativi­dade ser assaltada diariamente por novidades, especialmente as tecnológicas. Pre­núncios do século passado que começamos agora vivenciar intensamente.
O pensador britânico Kevin Desmond, conhecido estudioso da evolu­ção das tecnologias, publicou o livro A timetaMe ClfiJ1'7.JeJztions and disCO'veries (M. Evans & Co., lnc., NY), inédito no Brasil. Nesse livro, o autor apresen­ta uma curiosa, e ao mesmo tempo preocupante, visão da evolução do conhe­cimento acumulado pela humanidade. De acordo com ele, todo o conhecimento que a humanidade conseguiu produzir até o início do cristianismo foi multiplicado por 2 até a Revolução Industrial. Daí em diante o conhecimento voltou a dobrar, primeiro em 200 anos, depois em 50 e finalmente em 10 anos, até o surgimento dos primeiros computadores pessoais, no início dos anos 1980. Na penúltima década do século XX, o conhecimento foi multiplicado por 4 e na última por 10.
A se manter o ângulo da curva, o conhecimento acumulado em todo o mundo, de todas as áreas do saber humano e de todas as profissões, deve dobrar a cada ano aproximadamente. Por isso chamar qualquer profissional de "trabalhador do conhecimento" não é, absolutamente, exagero.
Estudar deixou de ser uma atividade típica de estudantes no sentido clás­sico. estudar assou a ser uma atividade continuada parece não ter fim Não é incomum ouvir jovens recém-formados em início de carreira afirmarem que estão estudando mais agora do que na faculdade.
Ter informação não é mais uma vantagem competitiva; ter conheci­mento, sim. Conhecimento é informação com significado, capaz de. criar movimento, modificar fatos, encontrar caminhos construir utilidade, fabricar beleza. Conhecimento é a grande vantagem competitiva da era que leva seu nome, como explicou o suíço Jean Piaget, pai do construtivismo, doutrina consagrada na maioria de nossas escolas, assim como o russo Lev Semenovich Vigotsky, outro gênio do estudo do pensamento, da lin­guagem e do desenvolvimento intelectual, não podemos transferir conhe­cimento, mas podemos construí-Io.
Cada pessoa constrói o próprio conhecimento, e isso vale para o aluno na escola para o funcionário na empresa ou para o cidadão na rua. Construí­mos nosso conhecimento usando as informações como unidades morfoló­gicas. Esse fenômeno tem início por volta dos 2 anos de idade, quando en­tendemos o significado das primeiras palavras e sua utilidade na comunica­ção e também passamos a utilizá-las como substância na construção de nosso conhecimento. Crescemos e o processo continua: se compreendermos o sig­nificado de uma informação, poderemos transformá-la em conhecimento. Por isso o mundo contemporâneo pós-muro de Berlim busca tanto a educação. Porque embora a informação venha pelos “meios comunicação", o amálgama dessa enxurrada, como a separação do joio do trigo, só . pode ser feito pela educação. E a educação deixou a escola ou melhor, não está mais apenas nela. Peter Drucker lembra: ''A velocidade das transformações na atualidade deve-se especialmente à mudança radical do significado do conhecimento". E aprendemos que conhecimento é um produto perecível: quando não usado, deteriora-se; quando não aumentado ou reciclado, desvaloriza-se.
Os colaboradores das empresas passaram a ser selecionados menos pelo que já sabem fazer e mais pelo que podem aprender a fazer, ou seja, por sua disponibilidade para aprender, para construir conhecimento de modo compartilhado.E a recíproca é verdadeira. Os bons funcionários passaram a querer trabalhar em uma empresa menos pelo que podem ganhar de dinheiro e mais pelo que podem ganhar de conhecimento. Até se pode atrair talentos com salários e planos de benefícios, mas só é possível retê-los com um ambiente de aprendizado contínuo.


2. Gestão do conhecimento

Um capítulo importante da administração de empresas passou a ser a gestão do conhecimento, que em algumas organizações fez aparecer até a figura de um responsável. O gestor do conhecimento. Trata-se de um tema novo que tem recebido muitas contribuições corretas e algumas equivocadas. Gerir conhecimento é diferente de processar dados
Logo de inicio deparamos com o fato de haver dois tipos distintos conhecimento, que merecem tratamentos particulares: o conhecimento explícito e o conhecimento tácito. Entende-se por explícito o conhecimento que pode ser transformado em instrumento de leitura, como um livro, uma apostila, uma página da internet ou da intranet de uma empresa.
Normas, procedimentos, condutas, rotinas, fórmulas, receitas, nomen­claturas, gráficos, datas são exemplos de conhecimento explícito. Alguém escreve e outros lêem o escrito. É o suficiente para que informações sejam passadas de um para muitos indivíduos. A internet tornou a passagem de conhecimento explícito algo rotineiro e imensamente abrangente. Raros são os temas que não podem ser acessados através da rede mundial de computa­dores, e a todos damos o rótulo de conhecimento explícito.
Já o conhecimento tácito recebeu esse nome em virtude do sentido da palavra latina tacitu, que significa silencioso, calado, que não emite ruído e não provoca rumor. Um ambiente tácito é um ambiente silencioso, próprio para a meditação. Um conhecimento tácito é o que não se exprime por palavras; normalmente está subentendido, implícito, e é transmitido por palavras que não são objetivas ou por gestos, comportamentos, posturas.
O conhecimento tácito deriva da experiência, da intuição, da sensibili­dade. Os profissionais o constroem por conta própria ao longo do tempo, às vezes de um tempo muito longo, e não sabem como compartilha-Ia, uma vez que não o receberam através de palavras. Um piloto de avião, por exemplo, recebe instruções explícitas através de materiais impressos, aulas e treinamentos, mas só se torna verdadeira­mente piloto após muitas horas de manche, em que literalmente sente o avião, suas reações a fenômenos meteorológicos ainda que pequenos, o en­contro do trem de aterrissagem com a pista, o momento exato de acionar os reversos, e assim por diante. Qualquer profissional, médico, mecânico, professor, administrador, cientista ou domador de cavalos adquiriu um conhecimento que é seu e foi construído por conta própria.
Hoje se acredita que boa parte conhecimento construído dessa forma possa ser compartilhada, e isso é muito desejável nas organizações, pois sabe-se que seu volume não é pequeno. Desperdiçar o conteúdo da cabeça de um técnico de produção industrial que se aposenta aos 35 anos de atividade na área é o mesmo que queimar uma biblioteca.
Esse conhecimento tácito, invisível, só pode ser compartilhado através das relações humanas. Não há apostila que dê conta disso. Mais uma vez aparece a importância do componente humano do profissional.
Um exemplo clássico, muito utilizado por sua clareza, é o da receita de pastel: quando a seguimos fielmente, temos certeza de que acertaremos, po­rém isso nem sempre acontece. Falta algo que não pôde ser posto no papel, como o ponto da massa, o sabor da mistura dos temperos, a quantidade de recheio em relação ao tamanho do pastel. Essas são informações que só podem ser transmitidas quando o aprendiz fica: o lado do mestre, que pega sua mão para compartilhar a densidade da massa, que reparte a prova do tempero na mesma colher, que pede que ele também \ ,lhe dentro do forno para ver a cor do acepipe.
Eis a importância da criação de um ambiente humano saudável, capaz de permitir a colaboração e o aprendizado nas empresas, nas equipes, nas escolas da vida.

3. Conhecimento não se transfere
Mas se constrói. Conhecimento é algo pessoal, propriedade de quem o detém e.não pode ser transferido para uma outra pessoa por inteiro, com todas as suas características; sentimentos, detalhes e significados.
Quanto às informações, estas, sim, podem ser transferidas. E com base nelas outra pessoa poderá construir o próprio conhecimento. Quando um professor dá uma aula, está, na verdade, passando dados, informações, conteúdos, na expectativa de que os alunos utilizem essa matéria-prima com a finalidade de construir, eles próprios, seu conhecimento.
Além de informações, dois outros elementos são necessários para a construção do conhecimento a percepção do significado e a criação de um elo afetivo. O significado é fundamental porque a mente humana tende a rejeitar informações que não tenham utilidade. Eis o erro principal de modelos educacionais que se baseiam apenas nos conteúdos, sem criar contextualizações significados.
Aprendemos de verdade apenas aquilo que pode ser utilizado para trans­formar nossa vida para melhor. Faz sentido. Todos nos lembramos de que. assistimos a aulas no colégio cujo conteúdo nos fazia pensar em que utilidade teriam elas em nossa vida prática. Mas rapidamente aprendíamos que aquela matéria era importante porque iria cair na prova. Como conseqüência disso, passamos a elaborar modelos mentais que nos permitissem estudar o suficiente para ter sucesso na prova.
O que "cai na prova" não necessariamente "cai na vida". E então se transforma apenas em um treinamento imediato de capacitação para respon­der questões, e não para utilizar o novo saber com a finalidade transformadora a que se deveria propor.
Em resumo: conhecimento não se transfere, mas se constrói e esse conceito redireciona o papel dos educadores, sejam eles professores no colégio, na faculdade ou na empresa. Neste último caso, não importa se o educador faz parte da equipe de educação e treinamento formal da empresa ou se é um líder de grupo, ainda que apresentado com o nome de gerente ou diretor.
Colaboradores aprendem e desenvolvem competências embasados nas mesmas premissas. Qualquer pessoa aprende quando percebe o significado do objeto do aprendizado e, obedecendo à mesma lógica, qualquer pessoa desempenha melhor seu trabalho quando consegue perceber o significado dele, seu valor e sua importância. Ponto para a pedagogia.


4. As Quatro áreas do conhecimento
Trabalhamos com temas ligados à qualificação humana de profissio­nais de todas as áreas. Para tanto, trilhamos o caminho do pensamento com.todas as suas inter-relações. Falamos em aprender (ou reaprender) a pensa, conscientes de que sabemos que sabemos, para não ser mais alguns na caverna de Platão. E as ferramentas utilizadas na arte de pensar são emprestadas de algumas áreas do conhecimento sobre as quais vale a pena parar para... Pensar: a filosofia, Ciência arte, á religião.
Filosofia é por essência, o estudo que nos permite ampliar a compreensão de todos os fatos da vida pela busca incessante de seus significados. O Filósofo é alguém que mais do que. responder sabe perguntar. Interessa por todas as questões, mas em especial por aquelas que inquietam o homem, como a razão de nossa existência e a origem do universo.
As soluções da maioria das angústias de todo ser humano não são encontradas fora, mais dentro de nós mesmo As respostas do mundo em geral satisfazem apenas às dúvidas menos importantes, como os motivos por que os preços sobem, por que o trânsito está ruim, por que nos falta tempo, por que estamos com dor de cabeça.
As grandes respostas se confundem com as próprias perguntas. Portanto começa a responder aquele mesmo que elabora a pergunta. Não há com­pêndios, dicionários nem escolas que nos respondam com precisão por que realmente vivemos, como devemos construir nossa escala de valores, se existe ou não vida após a morte e se, afinal, Deus existe ou não.
Filosofar não é, portanto, saber responder, mas saber perguntar, ain­da que o filósofo - que posso ser eu ou que pode ser você - saiba por antecipação que nenhuma resposta será satisfatória de verdade. Penso, logo existo, diria o matemático e filósofo francês, René Descartes. Pergunto, logo filosofo, diríamos nós, os angustiados filósofos contemporâneos. Existe exatamente para responder, e o faz através da Metodologia científica, que usa como método a indução. Enquanto a dedução é à base da lógica clássica, a indução é à base da ciência.
De origem latina, deduzir significa "levar" e induzir significa "trazer". O método dedutivo parte do geral para o particular e o indutivo do particular para o universal.
Quando deduzimos algo, partimos de premissas já conhecidas, che­gando, portanto, a verdades praticamente inquestionáveis. De novo Des­cartes: todos os homens que existem pensam. Eu penso, logo existo. Esse exercício também pode ser chamado de silogismo, forma clássica do racio­cínio dedutivo.
Já a indução é mais complexa. Ao partir do particular para o geral, busca a generalização, muito mais difícil de ser provada. A dedução pode ser ape­nas um exercício do pensamento. A indução depende também da experiên­cia. E é nesse ponto que surge a ciência. No método experimental, para provar premissas especulativas. Essa busca fabulosa na criação de conceitos definitivos, e é justamente na tentativa de buscar o conhecimento científico. que desenvolvemos a capacidade de pensar.
O pensamento da indução científica contaminou humanidade. Claro que pensamos diferentemente depois do telescópio de Galileu, da maçã de Newton e da relatividade de Einstein.
A arte, como disse Picasso, é a "mentira que nos permite enxergar a verdade”. Quando se deseja conhecer a evolução da humanidade utilizando-se de uma via segura, pode-se confiar na arte.
Das cavernas de Altamira, de Cro-Magnon e de Lascoux ao cinema dos efeitos especiais de George Lucas e Steven Spielberg, passando pelos vasos gregos, pelas tumbas egípcias, pelos afrescos das igrejas medievais, pelas obras renascentistas de da Vinci, Rafael e Miche1angelo, pelo impres­sionismo de Renoir, pelo cubismo de Picasso, e Braquc ou mesmo pela pop-arte de Andy Warhol, percebemos que a arte registra o pensamento domi­nante de um tempo. É de tal forma contundente que às vezes se duvida de que a arte venha do pensamento de uma era ou, pelo contrário, ele é que foi criado por ela. O melhor exemplo disso é o Renascimento, o período compreendido entre o final do século XlV e meados do século XVI. Todos conhecemos a importância do Renascimento para o pensamento e o comportamento hu­mano, mas em geral esquecemos que, na verdade, ele foi um influente movi­mento cultural e artístico iniciado no norte da Itália, mais precisamente em Florença, que se expandiu pela Europa por duzentos anos (naquela época as coisas andavam mais devagar) e que tratou essencialmente de recolocar o homem (como era na Antiguidade, especialmente grega) no centro da aten­ção artística. Durante a Idade Média, a arte esteve totalmente voltada para Deus e os santos, e não para o homem.

A religião, Não há como negar a importância das diversas correntes religiosas para o modo de pensar de uma população e, por fim, de toda a humanidade. O politeísmo grego, os imperadores-deuses dos egípcios, a com­paixão de Jesus - transformada no cristianismo -, as revelações de Maomé, as percepções de Buda.
Eles promoveram orientações no pensar com conseqüências no agir, no construir e no conviver. Como o homem é um ser carregado de dúvidas exis­tenciais, busca e encontra na religião, se não resposta, pelo menos alívio para essas questões. De certa forma, as mesmas questões que preocupam os filóso­fos - quem sou, como o mundo se formou, o que acontece depois da morte - também ocupam a mente e o tempo dos religiosos.
A matéria-prima da filosofia é a lógica, a da ciência é a curiosidade, a da arte é a sensibilidade e a da religião é a fé. Esta última tem como principal virtude servir de atalho para a esperança. Como disse Santo Agostinho, “ao construir o futuro, temos de nos basear no cálculo, mas também temos de considerar a esperança".
O eterno aprendiz
Coração de estudante
O que você leu no capítulo anterior permite supor que uma qualidade relevante dos profissionais da atualidade é a inquietude relativa ao aprendizado. Manter o coração de estudante batendo durante toda a vida passou ser fundamental para a sobrevivência e para o desenvolvimento profissional e para ir além da competência
O sistema educacional brasileiro divide a educação em graus. O. primeiro grau, também chamado de ensino fundamental, é composto de nove anos. O segundo grau, conhecido como ensino médio, apresenta três anos. O ter­ceiro grau é o ensino superior, ou seja, a faculdade e a pós-graduação. Hoje já se fala em quarto grau. :
O quarto grau equivale à continuação de. ensino formal e prolonga-se por toda a vida, podendo também ser chamado de educação continuada. Na atualidade, a educação corporativa tem ganhado espaço dentro das organiza­ções com a finalidade de atender à demanda da educação continuada. O tema é tão significativo a ponto de ter sido criada a expressão "universidade corporativa", aplicada às estruturas internas de educação nas empresas, que procuram corrigir as falhas da educação convencional oferecida pelas escolas e faculdades.
Embora seja uma iniciativa bastante louvável, algumas empresas conti­nuam cometendo um erro comum: o de criar uma universidade corporativa que nada mais é que uma ampliação do antigo departamento de treinamen­to de recursos humanos. Em primeiro lugar, deve-se ter em mente a diferen­ça entre treinamento e educação.
O Treinamento tem por finalidade desenvolver uma habilidade especí­fica, como operar uma máquina, realizar um procedimento rotineiro ou aten­der pessoas dentro de uma faixa estreita de responsabilidade. Já o objetivo da educação é aumentar o pensamento crítico do indivíduo, bem como capacitá­-los a aprender novos conteúdos por conta própria.
O treinamento capacita o profissional; a educação desenvolve a pessoa.
Essa diferença pode parecer sutil, mas é imensa, e o sucesso ou o fracasso de um investimento em educação corporativa reside na percepção da aplicação adequada dos procedimentos educacionais, como materiais, capacitadores, motivações, conteúdos e principalmente bases conceituais.
É fundamental entender que a responsabilidade pelo desenvolvimento humano na idade adulta cabe, acima de tudo, ao próprio indivíduo. A mis­são de uma empresa não é desenvolver pessoas, e sim fornecer os meios para que as pessoas se desenvolvam. Se essas duas consciências existirem, encon­tramos o melhor dos mundos, e todos ganham: a empresa, os colaboradores, os clientes, a sociedade. O coração de estudante não pode parar de pulsar.


5. Princípios de Aprendizado
O tema educação é um dos mais vastos das ciências humanas. Discorrer aqui sobre os princípios do aprendizado ou da relação ensino/aprendizagem implica o risco da superficialidade, mas, aceitando esse risco, apresento qua­tro princípios bastante pertinentes a este espaço.

Primeiro princípio: toda pessoa é capaz de aprender. Por definição, o ser humano é um animal que aprende, e o faz durante toda a vida. Todos têm capacidade de aprender, dentro do conceito que considera o aprender um fenômeno de receber estímulos, processá-los, c1assificá-los e armazená­los, com a finalidade de criar uma nova consciência de si e do mundo, provo­cando modificações comportamentais.
Quando alguém diz que uma pessoa, adulto ou criança, não aprende, o erro não está nessa pessoa, e sim no sistema que a confronta com o aprendizado. Alguma coisa de prejudicial está comprometendo uma condição bio­logicamente favorável e prevista, que é o fenômeno do aprendizado. Quatro aspectos podem prejudicar a condição natural de aprender: a) não existe adequação entre a maturidade do aprendiz e o objeto de aprendizado; b) há alguma deficiência biológica, por exemplo, a falta de alimentação adequada; c) o assunto é totalmente alheio aos interesses do aprendiz; e d) a comunica­ção entre quem deve ensinar e quem deveria aprender está totalmente preju­dicada. Os dois Últimos motivos são os mais freqüentes.
Segundo princípio: todas as potencialidades podem ser ampliadas.
Inclusive a potencialidade de aprender. Somos aprendizes em potencial, bas­tando, para tanto, o equilíbrio de nosso potencial com as exigências do ensi­no. Como qualquer outra parte do corpo, o cérebro vale-se da lei do uso e desuso, enunciada pelo biólogo francês Lamarck. Qyanto mais o utilizar­mos, melhor ele funcionará.

Nesse ponto, há uma coincidência entre educação e treinamento. En­quanto treinar significa desenvolver uma habilidade específica, educar signi­fica aumentar o pensamento crítico e potencializar a capacidade de aprender. Podemos então treinar o cérebro para que funcione de maneira mais lógica ou para que se relacione melhor com as letras e as palavras, para que comuni­que com mais qualidade as idéias concebidas, entre outras habilidades trei­náveis. O melhor programa de educação não é aquele que apresenta um imenso conteúdo a ser transmitido, mas o que desperta nos alunos o interesse e desenvolve neles o potencial de aprender.
Terceiro princípio: todos os limites são preconcebidos. Acreditar que uma pessoa não aprenderá determinado assunto é mero preconceito. Se ela receber o assunto através de uma comunicação adequada e se perceber a importância e o significado dele, aprenderá. Desde que, claro, tenha idade suficiente e esteja biologicamente saudável.

Portanto, estamos falando de preconceitos. Professores às vezes são pre­conceituosos quando consideram alguns alunos incapazes de aprender uma matéria. É provável que estejam sendo incompetentes para transmitir a ma­téria ou para despertar o interesse dos alunos. O pior dos preconceitos, entre­tanto, é o que o indivíduo costuma desenvolver contra si mesmo. Não são poucas as pessoas que se consideram incapazes de aprender. Na verdade, são incapazes, sim, não de aprender, mas de organizar-se para aprender. O pro­vável é que não tenham mobilização emocional.
Quarto princípio: é grande o componente emocional na aprendizagem.
O aprendizado pode ser um fenômeno intelectual, mas a aprendizagem é principalmente emocional. Para que fique claro, o aprendizado é o ato de aprender, o produto final, enquanto a aprendizagem é o processo que con­duz o indivíduo ao aprendizado.
E, nesse departamento, o emocional é fundamental. Costumamos apren­der com facilidade algo que para nós está carregado de significado ou com o qual conseguimos estabelecer rapidamente um vínculo afetivo. A seleção no aprendizado é afetiva, como também é na memória. Memorizamos sem di­ficuldade o número do telefone de uma empresa que dispõe de uma vaga para uma pessoa com o nosso perfil (significado) ou o de uma pessoa com a qual temos um interesse de envolvimento afetivo (elo emocional).
6. Vícios de nossa educação
Vivemos em um país cuja educação tem recebido atenção só há muito pouco tempo e, ainda assim, carregada de alguns vícios que dificultam ações efetivas, eficientes, de qualidade. Quando estudamos a história da educação no mundo e no Brasil, percebemos com facilidade esses vícios de origem.
Primeiro vício: no Brasil recém-descoberto, as ações educacionais têm início pelas mãos dos padres jesuítas, a quem devemos muito, pois trouxe­ram para cá princípios de moral e de compaixão, produtos raros nesses pri­meiros tempos de nossa História. Construíram igrejas, realizaram cerimônias de casamento e batismos. Opuseram-se aos abusos da escravidão e cuidaram das crianças. Fundaram também vilas que depois viraram cidades, entre elas a maior metrópole da América Latina, São Paulo.
Muito devemos a esses representantes da Companhia de Jesus, funda­da na Espanha pelo militar religioso Inácio de Loyola, depois santo da Igreja Católica. Mas não podemos deixar de considerar dois aspectos de sua pedagogia que terminaram por provocar considerável atraso na educa­ção brasileira. Primeiro: a educação jesuítica da época tinha como objetivo desenvolver virtudes, e não competências Isso equivale a dizer a um jovem que deve estudar para ir para o céu, e não para melhorar sua vida. Segundo: a cartilha pedagógica utilizada pelos mestres o Ratio Studiorum, tinha prin­cípios que hoje escandalizam os educadores e que mesmo na época já esta­vam defasados. Preconizava, por exemplo, a memorização da matéria, sem considerar seu entendimento, o que, obviamente, não é o melhor caminho para a Aprendizagem.
Segundo vício: quando, finalmente, o Estado começou a assumir a res­ponsabilidade pela educação, o mundo assistia ao início da Segunda Revolu­ção Industrial. A conseqüência foi um modelo fortemente influenciado pela demanda das indústrias. Essa influência não ocorreu apenas no Brasil, tendo sido percebida em quase todos os países no início da industrialização, a partir de meados do século XIX. esse propósito, o melhor é lembrar o que o escritor americano AIvin Toffer escreveu em seu livro A terceira onda:
A Revolução Industrial concebeu uma escola com o objetivo de for­mar para a obediência. A necessidade de preparação de mão-de-obra para as fábricas, que demandava educação em massa, tirou a responsabilidade da educação do domínio familiar e foi absorvida pelo Estado. Além da base técnica para o desempenho na fabrica, o sistema educacional passou a enfatizar a formação dos hábitos de pontualidade obediência e trabalho repetitivo. A disciplina passou a ser tratada não como um meio coadjuvante do aprendizado, mas com um fim em si mesma.
Terceiro vício: o vestibular. Como já dissemos anteriormente, educar não é treinar, não é passar adiante um conteúdo programático desprovido de significado. Entretanto, preparar para o vestibular é exatamente isso, uma espécie de treino para realizar uma prova. Educar é ensinar a pensar, no entanto a percepção do significado não é comum em nossos estudantes, de todos os níveis da educação formal, capacitação que seria necessária para a criação de um pensamento crítico. Equivale a dizer que o aluno estuda, mas não aprende de verdade porque não consegue perceber o valor que aquele saber terá em sua vida. Qualquer aluno tem, contudo, uma percepção: a de que aquele assunto cairá na prova. Como em nosso país o acesso ao ensino superior se dá através de uma prova de avaliação de conteúdo, passamos a confundir educar com ensinar a fazer prova, dada a importância desse mo­mento na vida dos jovens brasileiros.
Quarto vício: o excesso da prática da retórica. Aulas são elaboradas para permitir a passagem de uma grande quantidade de conteúdo em curto espaço de tempo. Isso exige que o professor fale muito e que os alunos se calem, e essa é exatamente a característica da retórica. Não se trata de um hábito incorreto desde que se crie a oportunidade de alguma dialética, ou seja, da participação dos alunos através de perguntas, acréscimos, respostas, dúvidas, interações, manifestações espontâneas. Se pela resposta podemos conhecer a erudição de uma pessoa, é pela pergunta que percebemos sua inteligência. Permitir a pergunta é estimular o pensamento, mas, infelizmente, esse é um hábito pouco incentivado na maioria de nossas escolas.
Entender os vícios de origem de nossa educação tem a finalidade de esclarecer por que e como podemos melhorar nossa qualidade pessoal de eternos estudantes, e digo eternos porque não podemos nos conceder o Iuxo de parar de estudar nunca. Quando saímos da escola, continuamos sendo “estudantes, então por conta própria, o que pode ser muito melhor desde que tenhamos o mínimo de conhecimento sobre como aprender com qualidade, evitando vícios antigos e práticas ultrapassadas”.
7. A penúltima edição
Nosso poeta Carlos Drummond de Andrade disse uma vez: "O proble­ma não é inventar. É ser inventado hora após hora, e nunca ficar pronta nossa edição convincente.”.
Nada mais sábio. Quem se considera pronto é muito presunçoso ou muito ignorante. Homens e mulheres de todas as idades continuam, muito além da chamada idade escolar, a buscar fontes de saber através das quais possam construir mais conhecimento útil e aumentar seu valor de mercado e principalmente seu valor humano. Não é incomum pais e mães com filhos crescidos voltarem aos bancos escolares, prestarem novos vestibulares, sujei­tando-se a enfrentar novos professores e livros na busca de especialização, mestrado ou doutorado.
Profissionais bem-sucedidos e bem colocados no mercado de trabalho continuam a manifestar o ímpeto de aprender, demonstrando, ao mesmo tempo, preocupação responsável e inconformismo legítimo. Empresas estimulam e pagam ou subsidiam cursos de línguas, de informática, de oratória, de redação, de temas transversais à atividade de seus funcionários. Educação nunca esteve tão na ordem do dia.
Na Era Industrial valia o produto, e as atenções voltavam-se para os processos de produção; na Era Pós-industrial, o mercado passou a ser va­lorizado e o novo foco das atenções voltou-se para a prática das pesquisas. Na Era da Comunicação, a propaganda foi à peça de resistência, Na Era do Conhecimento, integração de todas as tendências sinaliza a importância da educação.
Dentro do conjunto de características que convencionamos chamar de Metacompetência, a disposição para estudar, aprender novos conteúdos, apri­morar habilidades, aperfeiçoar-se pessoal e profissionalmente está entre as mais valorizadas. A vontade de aprender é mensurada subjetivamente, mas, mais do que isso, é valorizada e tida como decisiva no momento de uma contratação.
A breve discussão sobre os princípios básicos da educação e sobre os vícios de origem da educação brasileira serve para que o leitor, adulto o sufi­ciente para ler este livro, disponha agora de mais ferramentas para conduzir sua vida de eterno aprendiz, buscando o próprio estilo de aprimoramento constante, utilizando os princípios, evitando os vícios e ampliando sua consciência, que será sempre uma versão não terminada. Afinal, sempre podemos ser melhores. Paulo Freire, o grande educador pernambucano, escreveu em seu livro Pedagogia da Autonomia: "Mulheres e homens, somos os únicos seres que, social e historicamente, nos tornamos capazes de aprender. Por isso somos os únicos em que aprender é uma aventura criadora, por isso mesmo muito mais rico do que meramente repetir à lição dada. Aprender para nós é cons­truir, reconstruir, constatar para mudar, o que não se faz sem abertura ao risco e aventura do espírito".
8. O desenvolvimento humano como meta
O que é desenvolvimento humano
Há uma área da psicologia chamada psicologia do desenvolvimento. Sua função é estudar a forma como o ser humano se desenvolve, com a finalidade de corrigir desvios e estimular o progresso adequado do indivíduo desde o nascimento até a idade adulta.
A psicologia do desenvolvimento foi, e ainda é, um capítulo que inte­ressa sobremaneira ao campo da educação, isto que o desenvolvimento das crianças e dos jovens é uma preocupação bastante importante. Com o cres­cente cuidado com a qualificação das pessoas no ambiente de trabalho, esse assunto estendeu-se às empresas.
Interessa a essa ciência observar o desenvolvimento das pessoas em quatro aspectos: Físico-motor, intelectual, afetivo- emocional e social . Claro que o desenvolvimento físico-motor diz mais respeito à infância, pois refere-se à maturação neurofisiológica, à capacidade de manipular objetos ao controle dos movimentos do próprio corpo, e o maior desenvolvimento nessa área ocorre até os 2 anos de idade. Lesões físicas ou psicológicas nessa idade po­dem atrasar esse desenvolvimento, e às vezes são necessárias correções mesmo na idade adulta.
Já o desenvolvimento mental é fruto de uma construção contínua, em que se buscam a maturidade e a solidificação de estruturas mentais saudá­veis. Ao que tudo indica, o pleno desenvolvi mento, em que se atinge o ideal teórico, não é alcançado de modo satisfatório nunca. Eis porque o desenvol­vimento humano é, ou deveria ser, uma preocupação permanente para as escolas, para as organizações e, principalmente, para as próprias pessoas.
Dois aspectos são relevantes nesse capítulo da psicologia: a avaliação dos graus de desenvolvimento e a aplicação de ações corretivas a possíveis desvios. Várias teorias foram desenvolvidas a partir de observações, pesquisas, acom­panhamentos de indivíduos, estudos de casos clínicos etc. Entre todas as teorias, destaca-se o trabalho do psicólogo e biólogo suíço Jean Piaget. A extensão de sua obra e seu rigor científico transformaram Piaget na mais importante personalidade da área do desenvolvimento de pessoas.
A avaliação do grau de desenvolvimento é facilitada pelo uso de instru­mentos de psicometria. Já a ação de desenvolvimento conta com duas ferra­mentas importantes: a psicoterapia e a educação. Enquanto a psicoterapia é uma técnica a ser aplicada a uma pessoa de modo individual, ou no máximo a pequenos grupos, a educação é mais abrangente, podendo atingir uma po­pulação significativamente maior.

9. A Máquina do Tempo

Q1ando falamos sobre desenvolvimento humano, devemos considerar que o autoconhecimento é fundamental, e idealmente é do que primeiro devemos tratar. Acontece muito de termos toda a determinação e boa von­tade de compreender e aceitar a nós mesmos, aos outros e ao mundo - faz todo o sentido! -, mas, ainda assim, derraparmos, submetidos à influência de mitos, estereótipos e paradigmas, mais um contêiner de situações mal resolvidas acumuladas durante toda a vida.
A idéia de máquina do tempo é bastante antiga e está ligada menos à curiosidade de conhecer o futuro e mais ao desejo de voltar ao passado com a finalidade de modifica-Io e, com isso, interferir no presente. A maioria das pessoas que se dizem seduzidas pela idéia de voltar no tempo está motivada para fazer alguma coisa que não fez ou para não fazer algo que se arrependeu de ter feito.
Nesse sentido, a máquina do tempo já existe, é barata e acessível a todos: é a própria consciência. A percepção saudável da realidade permite que façamos uma conexão lúcida entre as experiências presentes e o signiflCado do passado. Alterações na experiência presente !de um indivíduo ou de uma sociedade) modificam o significado do passado. O passado não deve ser com­preendido apenas nos próprios termos, mas também em termos das percep­ções do presente.
À medida que amadurece, o homem vai transformando a maneira de ver o mundo, pois sua escala de valores sofre modificações naturais. O que pare­cia ter imensa importância aos 17 anos pode tornar-se ridículo aos 32. Se­guindo o mesmo raciocínio, quando terminamos o colégio não temos as preocupações que passamos a ter quando terminamos a faculdade. Nada mais lógico, pois a idade muda os centros de interesse e, com eles, muda a importância dos fatos que constroem a realidade que nos cerca. Fatos vividos e não totalmente resolvidos emocionalmente costumam acumular-se em nosso inconsciente sob a forma de recalques, que se mani­festam e interferem em nosso comportamento sem que tenhamos consciên­cia disso - até porque eles habitam, como já foi dito, a região inconsciente da mente. É o passado interferindo no presente. São velhos valores, total­mente desatualizados e invalidados, mas presentes como lembranças incons­cientes. Está na hora de acionar a máquina do tempo. Como? Ora, abrindo espaço para o exercício do autoconhecimento. A maioria dos erros que cometemos na vida deriva da falta de percepção de nossos alcances e de nossos limites. Aumentar o conhecimento de nós mes­mos permite o desenvolvimento de duas qualidades imprescindíveis ao bom funcionamento de nossa vida: a auto-estima e a autoconfiança.
O inconsciente é uma parte do aparelho psíquico regida por leis pró­prias de funcionamento. Não dispõe, por exemplo, das noções de tempo. Não sabe o que é passado e presente. E é justamente no inconsciente que se encontram os conteúdos reprimidos, que não têm acesso ao consciente por causa de censuras internas. Conteúdos anteriormente conscientes, quan­do reprimidos por força de algum fato externo, sedimentam-se no incons­ciente e podem se transformar em recalques, provocando limitações por toda a vida.
Como falta ao inconsciente a noção de tempo, o passado vira presente e nos aprisiona pelos sentimentos que já deveriam ter deixado de existir, uma " vez que nossos valores, assim como os do mundo, mudaram. Costumamos dizer que precisamos nos atualizar permanentemente, mas levamos isso ao pé da letra apenas no mundo profissional, intelectual e tecnológico. Devería­mos também atualizar nossa percepção de nós mesmos, e não apenas do mundo que nos rodeia.
Visitar o passado tem esta grande vantagem: a de limpar os escaninhos. Chamamos esse procedimento de análise, que tanto pode ser com o auxílio de outra pessoa, um profissional de psicologia - o que às vezes é indispen­sável -, como também recorrendo-se à prática da auto-análise através da interiorização. Sem medos, sem pudores e, principalmente, sem autocomise­ração, ou seja, sem pena de si mesmo. É um exercício fascinante. "Conhece ­te a ti mesmo" era a frase predileta de Sócrates, alguém profundamente comprometido com o que chamamos aqui de fator humano, o que parece estar além da competência. Acredite, ele sabia o que dizia!

10. Você em uma dinâmica de Grupo

o mercado não é uma entidade autônoma e desconectada dos demais representantes da civilização. Muda o mundo, muda a sociedade, mudam as pessoas, muda o mercado - que eventualmente muda o mundo, e assim por diante. Para não perder o bonde da História, precisamos nos manter equili­brados, inteiros, temos de buscar conhecer a nós mesmos sempre, em um processo contínuo de auto-desenvolvimento.
Digamos que você esteja participando da seleção para um emprego e a parte mais importante dessa seleção, a entrevista, será conduzida por seu provável futuro chefe. Você é uma pessoa bem formada, com um cur­rículo irretocável, e acaba de terminar um MBA numa escola respeitável. Tudo parece conspirar a seu favor, inclusive o fato de você já ter sido pré­-selecionado.
Mas nada disso ajuda você a ficar calmo. As pessoas experientes com as quais conversou, os artigos que leu nas revistas especializadas e os conselhos que ainda lembra de seus professores, tudo aponta para a mesma questão: a entrevista é a parte mais importante do processo seletivo porque nela são avaliadas as qualidades humanas do candidato; e atualmente essas qualidades são mais valorizadas do que as técnicas, pois a empresa pode completar a capacitação, mas personalidade e caráter devem vir prontos.
Então você se põe a fazer uma lista dai características pessoais que a empresa provavelmente vai valorizar - ou as descobre em algum manual prático - e pensa em treinar a maneira de demonstrar que as possui. Entre as principais características você coloca:
· Demonstrar segurança nas respostas, poi; a empresa deseja pessoas que sejam seguras e confiantes ao tratar com Situações novas e desconhecidas.
· Olhar o entrevistador nos olhos, pois quem olha para todos os lados aparenta nervosismo e medo.
· Deixar claro que você é uma pessoa ambiciosa, mas considera que os objetivos da empresa são a prioridade e que o trabalho da equipe deve ser respeitado.
· Esclarecer que você é capaz de assumir responsabilidades e que é um empreendedor nato, interessado em propor novas alternativas de sucesso para a empresa.
· Ser sociável, interessado, claro e objetivo nas respostas, demonstrando capacidade de estabelecer relações, conviver com grupos e com situações de conflito.
· E, acima de tudo, ser você mesmo e não tentar se fazer passar por uma pessoa perfeita, pois o entrevistador é capaz de perceber que você está tentando ser quem não é de verdade.
Mas espere um pouco. Isso quer dizer que eu tenho de ser tudo isso, e não apenas tentar ser? Mas como posso estar pronto, com todas as qualida­des que a empresa deseja de mim, antes mes no de começar a trabalhar e a entender com mais clareza os desejos impostos pela cultura organizacional?
Essa é uma pergunta importante e introduz várias outras. Afinal, te­nho de ser o que sou ou ser o que a empresa quer que eu seja? Será que só terei sucesso se houver lima feliz coincidência entre o que sou e o que os outros querem que eu seja? Afinal, o que vale mais: minha personalidade ou minha capacidade de adaptação? Quem é que se dá melhor hoje na selva corporativa: o personalíssimo crocodilo ou o adaptável camaleão? É o que veremos a seguir.

seja você mesmo

o tema auto-desenvolvimento me faz lembrar três personagens da peça Cyrano de Bergerac, de Edmond Rostand, ambientada na França do século XVII: Roxana, Cristiano e Cyrano.
Roxana era uma mulher belíssima, a mais cobiçada do lugar. Cristiano era um rapagão sarado, bonito e desejado pelas mulheres. Só tinha um pro­blema: quando abria a boca não saía nada de valor. Cyrano, por sua vez, era exatamente o contrário: um poeta nato, dotado de um humor agradável e de uma grande cultura, que encantava todas as pessoas. Mas ele também tinha um problema: ostentava um nariz ainda maior que sua cultura, o que fazia de sua figura algo entre o grotesco e o cômico.
Ambos estavam apaixonados por Roxana. Cyrano, em um gesto de al­truísmo, acreditando que era mais fácil corrigir a burrice de Cristiano do que a própria feiúra, resolveu ajudar o amigo. Passou a escrever as falas que Cris­tiano teria de usar para conquistar a bela mulher. Em algumas situações, Cyrano colocava-se à sombra de alguma árvore, declamando poemas en­quanto o amigo apenas gesticulava sob a janela da desejada mocinha.
O fim dessa história é bem conhecido. Roxana não se deixou enganar por muito tempo e acabou descobrindo que o autor de tão belas frases não era o guapo Cristiano, mas o feio e narigudo Cyrano. E este, surpreso, acabou per­cebendo que tinha, sim, alguma chance com a amada, pois ela estava interes­sada mais em sensibilidade e sinceridade do que em estampa e superficialidade.
O erro de Cristiano não foi, absolutamente, ter aceitado a ajuda do amigo.
Seu erro foi não ter aprendido com ele a ser melhor. Tentou ser o que não era, e não melhorar o que sempre fora. Ninguém precisa nascer poeta, bem como nin­guém nasce empreendedor, comunicativo, responsável, líder, flexível, colaborativo, ambicioso. Quem sabe todos nós possuímos essas características tão desejadas pelo mercado de trabalho, ainda que ocultas e latentes, precisando apenas da percepção de sua existência e de algum esforço para então se revelarem.
Se você é como Cristiano e a empresa é sua Roxana, não tente ser igual a seus ídolos, professores ou articulistas de revistas especializadas. Seja você mesmo, deixando claro para si e para seu entrevistador que está aprendendo sempre, e não apenas repetindo ladainhas pré-escritas. Lembre-se de Cyra­no, que, embora tenha duvidado de si próprio no início, acabou se dando bem mesmo com sua imperfeição.
11. Empresas são ambientes de aprendizado e colaboração
O homem e seu meio
A relação do homem com o meio que habita tem gerado uma acalorada discussão entre intelectuais de várias tendências. Com suas observações, dois geógrafos colocaram ainda mais lenha na fogueira desse assunto, criando duas escolas (tendências intelectuais): a determinista e a possibilista.
Do lado determinista, o alemão Frederico Ratzel afirmou que "o ho­mem é produto do meio geográfico em que vive, pois o meio natural exerce uma ação dominadora sobre ele, que termina por se submeter".
Do lado possibilista, o francês Vidal de Ia Blanche contestou, afirman­do que o homem é, sim, capaz de reagir a determinadas influências do meio, podendo modificá-Ias e adequá-Ias a suas necessidades. Em outras palavras, "o meio é o produto do homem".
Ambos os estudiosos têm razão. A influência do meio na conduta hu­mana é real, mas não podemos negar que o ser humano é exatamente o animal capaz de promover as transformações que vão mudando a face do planeta.


Ensinar
a pensar


“De pensar morreu um burro” "Quem pensa não faz" ... Muitos ditos populares expressam um certo sarcasmo e um desprezo em re­lação ao pensar, revelando uma crença, alimentada há séculos, de que o pensar atrapalha, em­perra a ação, é coisa de quem não tem nada para fazer.
Quando se trata, então, da fi­losofia, esse deboche vai ainda mais longe, afirmando que to­do pensador não possui pé na realidade e vive numa torre de marfim
É certo que o tempo da refle­xão conflita com a urgência do agir. Mas nem sempre todo agir é assim urgente e, na maioria da vezes, parar para pensar nos, salva de decisões equivocadas e prejudiciais. Pensar a respeito de alguma coisa ou de algum acontecimento é compreender os seus verdadeiros sentidos e significados.
Um artigo publicado na Fo­lha no dia 10 de outubro deste ano comentava o Saeb, exame federal de avaliação da apren­dizagem de alunos do último ano do ensino médio. Mal alfa­betizados, esses adolescentes, nas palavras do jornalista, não conseguem, por exemplo, com­preender o efeito de humor provocado por ambigüidade de palavras ou reconhecer dife­rentes opiniões em um mesmo texto".
Quem não sabe ler não sabe dlstinguir nem rir de fato, nem pensar. E presa fácil de mistifi­cações e sujeições, obediente a. tudo o que causar a impressão mais forte.
O pensar, diz Sócrates, "abre os olhos do espírito". E isso quer dizer que a reflexão explicita mal-entendidos, desvela segundas intenções, percebe mentiras, desautoriza precon­ceitos, descobre manipula­ções ... Em decorrência, senti­mo-nos capacitados para esco­lher, dizer não, colocar limites, mudar a ordem das coisas, re­definir destinos, desarticular dominações ...
Em outras palavras, o pensar prepara nossa liberdade e nos­sa autonomia tanto quanto nos faz reconhecer as responsabili­dades que nos cabem nas situa­ções vividas.
Liberdade e autonomia, con­venhamos, não são comporta­mentos muito bem-vindos na esfera político-social, porque ameaçam o poder vigente.
E, na esfera da vida privada, a responsabilidade é, na maioria das vezes, temida e recusada pelas pessoas, porque cria en­cargos e compromissos. Liberdade, autonomia, res­ponsabilidade? ... O pensar põe em perigo. E, em grande parte, por isso mesmo, ele é estrategi­camente convertido em objeto de escárnio.
Ensinara pensar. É esse o único projeto que poderia nos tirar do atoleiro de pobreza, de violência e de impotência em que vivemos .. É um projeto cuja origem não está em nenhuma economia nem ideologia ou política oficial. Não. precisa de equipamentos especiais nem depende da criação de uma secretaria do pensamento . .E só uma atitude. Ensinar a pensar, Aprender a pensar.

DULCE CRITELLI – Quinta Feira 25 de outubro 2007 –Folha de São Paulo
Terapeuta existencial e professora de filosofia da PUC -SP, é autora de "Educação e Dominação Cultural"
e "Analítica de Sentido" e coordenadora do Existência -Centro de Orientação e Estudos da Condição Humana
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