Qual a explicação do PT e sua liderança !
Desculpas?
Culpa da
oposição?
O poder a todo
custo.
O Brasil esperava mais que populismo.
O Povo
Brasileiro sempre honesto e varonil não merece tal vergonha.
Publiquei em 09/02/2010
"O Dia em que
o PT Morreu" de Valério ( ironia do destino) Arcary
Estou
disponibilizando novamente para voce meu leitor
"O fim
justifica os meios? Essa doutrina contraditória, psicologicamente inconcebível,
foi malignamente atribuída aos jesuítas pelos seus adversários protestantes - e
às vezes católicos - que, por sua vez, pouco se preocupavam com escrúpulos na
escolha dos meios para atingir seus próprios"fins"(...)Por sua vez,
os jesuítas, rivalizando com os protestantes, adaptaram-se cada vez mais ao
espíri to da sociedade burguesa e dos três votos - pobreza, castidade e
obediência - conservaram apenas o último, ainda assim de forma bastante
atenuada. Do ponto de vista do ideal cristão, a moral dos jesuítas caiu tanto
mais baixo quanto mais eles cessaram de ser jesuítas. De guerrilheiros da
Igreja passaram a ser burocratas e, como todos os burocratas, uns pilantras de
primeira.". Leon Trotsky[1] Reler os clássicos quando estamos diante de
acontecimentos que sugerem mudanças de dimensões históricas é uma das tradições
da esquerda que se perdeu, mas que devemos recuperar. A epígrafe de Trotsky
remete a dois dos temas candentes da conjuntura brasileira: a relação entre os
fins e os meios para uma estratégia socialista, e os processos de adaptação
social e deformação política de organizações que se transformam no contrário do
que pretendiam ser quando constituídas. Trotsky admite que a Companhia de Jesus
nasceu como umaresposta medieval à Reforma Protestante, portanto,
historicamente, reacionária, porém, com o tempo, se adaptou às pressões sociais
do capitalismo. Os jesuítas, até para permanecer no Vaticano, deixaram de ser
jesuítas. O processo de evolução histórica do PT chegou, também, a uma
encruzilhada: para se credenciar como um partido eleitoral resignado aos
estreitos limites do regime democrático-liberal no Brasil, ao longo dos vinte
anos que nos separam do fim do regime militar, o PT precisou deixar de ser
petista. Renegar a sua origem foi um processo de readequação política, mas,
também, de transformismo social, uma ruptura com as bases sociais de sua
constituição apoiado na CUT e no MST. São dois, também, os argumentos deste
artigo. O primeiro éa constatação inescapável, mas que encontra previsíveis
resistências, de que a crise do PT é terminal. O segundo é a defesa da luta
contra a corrupção como uma bandeira democrática incontornável do programa da
revolução brasileira, tema polêmico, portanto, vital, para a reorganização
sindical e política em curso, com o colapso da CUT e do PT. Estas duas
premissas se articulam para defender que a esquerda anti-capitalista não pode
hesitar diante da luta para derrubar o governo Lula. Estamos diante de uma nova
etapa histórica. Afinal, já foram dez os presidentes eleitos e derrubados na
América Latina - por mobilizações de massas operárias e populares, não por golpes
militares pró-americanos, como na sequência da revolução cubana - depois do fim
dos anos oitenta, expressando a fragilidade da democracia-liberal no
continente. O que nos devolverá à discussão sobre os fins e os meios.
Capitalismo e corrupção Recordemos, para começo de conversa, o que a história e
o marxismo nos deixaram como fundamentos "graníticos" sobre a
corrupção. Nunca existiu capitalismo sem corrupção. Capital e Estado estiveram
sempre unidos através das mais variadas cumplicidades. Desde o alvorecer das
pioneiras Repúblicas italianas, quando a Europa recuperou ao Islã o controle
das lucrativas rotas comerciais do Mediterrâneo, passando pela conquista da
América pelas Coroas ibéricas, sem esquecer os quase cento e cinqüenta anos de
disputa entre Londres e Paris pela supremacia no mercado mundial: a corrupção
estava lá, em todos os portos, em todos tribunais, em todas as Cortes, em todas
as línguas. A corrupção nunca foi privilégio dos latinos, nem dos chineses, nem
dos árabes. Desde o século XIX falou, sobretudo, o latim moderno, o inglês.
Comprando favores, deslocando concorrentes, driblando as leis, subornando
autoridades, obtendo cargos. A força do dinheiro abrindo as gavetas do poder, e
o domínio do Estado favorecendo os cofres da riqueza. Quando argumentamos que
capitalismo e corrupção sempre caminharam de mãos dadas, muitos nos perguntam
se a corrupção não seria inevitável em qualquer sociedade, porque, afinal,
ninguém ignora que tanto na URSS, quanto na China, as burocracias estatais se
regozijavam em privilégios driblando as suas próprias leis. A corrupção não
seria expressão das incoerências sombrias da natureza humana? Os socialistas
defendem que não existe fatalismo na condição humana que nos condene a
corrupção. Assim como existiram sociedades que desconheceram a exploração do
homem pelo homem, ignoraram a corrupção. A corrupção é uma doença
econômico-social, e se explica em função de circunstâncias históricas. A
percepção de que, no Brasil, a apropriação privada do Estado pelo mundo dos negócios
teve sempre na sua raiz a impressionante desigualdade econômica e social, é
chave para mantermos o sentido das proporções diante do colapso do PT. Ao se
transformar, a partir de 1988, em um partido que se credenciava para a gestão
do Estado sem ameaçar o capitalismo, o PT selou o seu destino. Um programa de
adaptação política a um capitalismo que não cresce, em uma sociedade em que a
desigualdade não deixa de aumentar, e na qual a mobilidade social vem
diminuindo há um quarto de século, ou seja, um reformismo sem reformas, não
poderia evitar a degeneração metodológica e ética. Ensina a sabedoria oriental
que o peixe morre pela cabeça. Já o Padre Antonio Vieira dizia que o peixe
apodrece pela cabeça. O marxismo alerta que a cabeça não é imune à pressão do
chão que os pés pisam. O PT escolheu um caminho de social democratização que
játinha sido trilhado na América Latina por muitos outros, até por organizações
que encabeçaram revoluções democráticas, como os sandinistas.Se, mesmo os
partidos que se formaram na severidade das condições da luta armada contra
ditaduras - como a FSLN, os Tupamaros ou a Farabundo Marti - quando aceitaram
se transformar em partidos eleitorais, se descobriram vulneráveis diante da
pressão política e social da democracia liberal, parece inescapável que o PT,
que já nasceu como um partido eleitoral, seria presa fácil da corrupção
endêmica do Estado brasileiro. Era, no fundo, só uma questão de tempo, para que
o PT evoluísse do financiamento legal dos monopólios - em prática desde 1994 -
para um sistema de caixa dois - a exemplo dos partidos tradicionais - e,
depois, para a transferência derecursos arrecadados para os partidos aliados, o
sistema de mensalão para assegurar maioria no Congresso, culminando com o
enriquecimento ilícito dos seus burocratas. O domínio do Capital sempre foi a
associação legal e ou ilegal, portanto, sempre ilegítima e imoral, da riqueza
com o poder. Todos os partidos comprometidos com o regime democrático-eleitoral
e, por isso, financiados pelo capital, foram aliciados, em todos os tempos e
lugares, pela força do dinheiro. Nos últimos cem anos, à escala mundial, a
imensa maioria dos instrumentos da representação política dos trabalhadores, no
centro ou na periferia, quando se consolidaram regimes democráticos, foram
absorvidos pela pressão do eleitoralismo. A social democracia européia antes da
I guerra, ou os partidos eurocomunistas depois dos anos 60, muito antes do PT,
confirmaram que é difícil, politicamente, e complexa, social e
organizativamente, a construção de reservas ou filtros de imunidade diante da
pressão de forças sociais hostis. Degeneraram, absorvendo além dos métodos do
eleitoralismo, os seus vícios. Seus dirigentes, fossem do SPD na Alemanha e do
Labour na Inglaterra, ou do PCF na França e do PCI italiano, experimentaram,
primeiro nos parlamentos, depois com o ministerialismo, um processo de ascensão
econômica e acomodação social irrecuperável. Adaptação política e degeneração
burocrática Admitamos, contudo, que os privilégios dos aparelhos social-democratas
foram a ante-sala de aberrações ainda mais graves. Não bastassem as
desprezíveis excentricidades da burocracia russa, como a coleção de automóveis
de Brejnev, ou a cômica sucessão de tipo monárquico, em nome do socialismo, do
regime totalitário na Coréia do Norte, a esquerda do século XX viveu a
degradação do assalto dos sandinistas às mansões na Nicarágua. Pressões sociais
em sociedades desiguais nunca devem ser, portanto, subestimadas: os que se
deixam confundir politicamente, assimilam os métodos da política burguesa - em
que tudo são mercadorias, incluindo o voto - e, finalmente, se rendem a um modo
de vida de ostentação. É o que confessam os principais líderes petistas quando,
de maneira até grotesca, invocam absolvição porque estavam agindo de acordo com
as "regras do jogo". Mas, agora, o PT morreu. Morreu,
comparativamente, como o estalinismo morreu com a queda do muro de Berlim. Está
acontecendo o que os dialéticos denominam o salto de quantidade em qualidade. Quando
o publicitário que criou o Lulinha paz e amor confessou seus pecados, ironia da
história, enfiou uma adaga no coração do PT. O enquadramento histórico parece
incontornável, sob pena de qualquer análise sucumbir aos impressionismos de
conjuntura. Só uma perspectiva mais ampla permitirá explicar como o partido
político que foi a expressão eleitoral do movimento operário sindical e da
maioria dos movimentos sociais brasileiros nos anos oitenta, se transformou, a
partir de sua mais alta direção, irrecuperavelmente, neste espantoso amálgama
de arrivistas e vigaristas. O tema da burocratização dos partidos de
trabalhadores assalariados em sociedades urbanas permanece um fenômeno
polêmico. Ao analisar a socialdemocracia de cem anos atrás, Lenin recorreu ao
conceito de aristocracia operária para tentar explicar a crescente
diferenciação social no mundo do trabalho na passagem do século XIX para o XX,
e tentar compreender porque uma maioria das bases sociais e eleitorais da
socialdemocracia apoiou seus respectivos governos, quando do início da guerra
de 1914. No entanto, é menos lembrado que Lenin previu que esse apoio seria
efêmero, mesmo entre os setores da classe trabalhadora que obtiveram concessões
na etapa histórica anterior. A aristocratização de um segmento da classe
operária era compreendido pela esquerda marxista como um fenômeno,
essencialmente, econômico e social, enquanto o agigantamento do aparelho
sindical e das frações parlamentares absorvidos pelo Estado, era discutido como
um processo, essencialmente, político-social. Aristocracia operária e
burocracia operária não eram identificados como o mesmo fenômeno social, porque
a aristocracia, um conceito relativo às condições materiais e culturais de
existência da classe trabalhadora de cada país. Permanecia sendo um setor de classe,
ainda que privilegiado, enquanto a burocracia sindical e parlamentar dos
aparelhos socialdemocratas seria uma casta exterior ao proletariado. A
experiência do PT e da CUT é uma confirmação quase caricatural deste
prognóstico. Crise terminal do PT e enfraquecimento do governo Lula. Estamos há
dois meses diante de duas crises que, não sendo iguais, correm paralelas e são
indissociáveis: a crise terminal do PT e a crise política do governo Lula. O
PT, tal como foi nos últimos vinte e cinco anos, não poderá resistir. Estamos
acompanhando uma revolução mental na cabeça de milhões de trabalhadores e
jovens, um processo de importância histórica. O PT poderá, talvez, subsistir
como um partido eleitoral, ainda assim, se expulsar grande parte da sua direção
histórica, mas nunca mais poderá ocupar o papel que teve junto aos setores
organizados das classes trabalhadoras e aos movimentos sociais. Será um partido
eleitoral com outra base social. Enganam-se aqueles que subestimam a atual
crise do petismo. O desmoronamento da autoridade do PT - em menor medida, do
próprio Lula - que se aguentou na corda bamba nos primeiros trinta meses de
governo, mesmo se com uma política anti-popular, tende a ser vertiginoso. O que
não impede que as parcelas mais atrasadas, desinformadas e, sobretudo,
desorganizadas da população, aquelas que foram as últimas a girar
eleitoralmente para o apoio a Lula, possam continuar exprimindo durante alguns
meses, ou até mais tempo, intenção de voto em Lula para 2006. Foram os últimos
a se deslocar para o apoio a Lula, porque nunca tiveram referência no PT ou, de
resto, em qualquer partido, e serão os últimos a romper. Esse processo profundo
e mais lento não será, contudo, relevante para o destino do PT. O futuro do PT
está sendo decidido nas grandes fábricas, como nas montadoras e nas
siderúrgicas, nas refinarias da Petrobrás, nas Universidades, entre as classes
médias de alta escolaridade e baixos salários, enfim, nas grandes cidades e nos
movimentos sociais que sempre foram a sua retaguarda social. Já o governo Lula
ainda não acabou - não se sustentava somente no PT - embora esteja muito
fragilizado. Dependeu nestes trinta meses do apoio do imperialismo, da banca,
das empreiteiras, da mídia, enfim, das instituições, como o Congresso, o
judiciário e as FFAA, embora não fosse a opção preferencial da burguesia nas
eleições de 2002. A
sua manutenção, mesmo se agônica, na forma de um governo Palocci/Lula interessa
às forças sociais e políticas comprometidas com a preservação da ordem. Não
surpreende que estejam atarefadíssimas na articulação de um "acordão"
que poupe Lula - e o próprio congresso - de um impeachment, da posse de Alencar
ou de eleições antecipadas. Entretanto, a crise permanece aberta. O Governo
Lula/Dirceu/Palocci dos últimos dois anos e meio não existe mais. O governo
Lula vive, por suposto, uma profunda crise política desde que se precipitou a
denúncia de que o PT teria transferido fundos para os partidos de aluguel como
o PL, PP e PTB, reconhecidas pelo próprio Roberto Jefferson como mercenárias, e
que lhe garantiram uma maioria no Congresso Nacional, como aliás já faziam para
o governo FHC. Não é segredo para ninguém bem informado que há muitos anos,
pelo menos de 1994, o PT tem financiado as suas campanhas com milionárias
contribuições dos principais monopólios brasileiros. Mas, apesar destas
evidências, a direção do PT manteve a imagem de sua integridade moral intacta
diante da maioria de suas bases sociais. Argumentava que aceitar o dinheiro das
grandes corporações era parte das "regras do jogo", ou seja, que os
fins justificavam os meios. As denúncias do "mensalão" poderão ser,
contudo, decisivas para confirmar o que já se suspeitava há muito: (a) que o PT
mantém, também, a exemplo dos partidos burgueses, um caixa dois para
financiamento eleitoral; (b) que o PT, quando no Governo federal - e por que
não, quando nos estados e municípios? - favoreceu empresas privadas, como as
empreiteiras que concorrem pelos contratos milionários de arrecadação de lixo,
ou as publicitárias, em licitações públicas; (c) que ocorreram desde 1988 dois
processos simultâneos e indivisíveis: profissionalização de um aparelho de
vários milhares de quadros que fazem um rodízio nacional pelos cargos de
prefeituras e administrações estaduais, associado ao enriquecimento ilícito de
uma parte de sua direção. A questão decisiva para a esquerda anti-capitalista
social e política é ajudar a unir estas duas crises que correm em ritmos
diferentes: fazer que a perda de confiança na CUT e no PT se transforme em
ruptura política como o governo Lula. Ajudar os milhões que formaram ao longo
dos últimos vinte e cinco anos a base social do petismo a ir além da tristeza e
do desânimo, e construir uma mobilização que traga um setor de massas, no
início, um setor mais avançado e, possivelmente, mais jovem, para as ruas. O
que não avança, retrocede. Já sabemos que, se não houver pressão popular,
acrise se resolverá por dentro das instituições com algumas cassações de
deputados - e com algumas, poucas, expulsões do PT - e Lula procurará relocalizar
seu governo diante da burguesia prometendo a reforma política, a sindical, e a
jóia mais cobiçada de todas, a reforma trabalhista. Não há porque temer a
debilitação do governo e, se possível, a sua derrubada. O governo Lula não é um
governo de esquerda. Quem o disse foi ninguém menos ... do que o próprio Lula.
Praticou o maior superávit de orçamento da história do país, transferindo mais
de R$150 bilhões por ano para os rentistas dos juros da dívida interna,
sacrificando a educação e a saúde pública. Não há quem duvide que Serra não
poderia ter feito a Reforma anti-popular da Previdência que Lula fez. O governo
Lula é um governo socialmente burguês, economicamente neoliberal, politicamente
reacionário. A natureza do governo Lula alimentou, contudo, inúmeras confusões
na esquerda. O marxismo se distingue como corrente teórico-política,
justamente, pelo esforço de fazer caracterizações sociais dos fenômenos
políticos. Grande parte da intelectualidade petista, e a esquerda do PT - o
próprio MST - invocaram a fórmula elíptica de um governo em disputa, um híbrido
social. Mas, com o tempo, ficou claro que a mão pesou demais. É muito razoável
reconhecer que todo governo pode ter uma ala esquerda, no sentido de que o
ministério pode ser heterogêneo, porém, finalmente, há uma dinâmica que se
impõe. O governo Lula não permite paralelo, por exemplo, com o governo Chavez,
que era o grande temor de uma parcela do governo americano, tranqüilizada pela
embaixadora de Washington em
Brasília. O governo Chavez remete às experiências do Governo
Cárdenas no México dos anos trinta, e aos governos Perón na Argentina e Vargas
no Brasil, nos anos cinqüenta. Após a crise de 1929, quando a supremacia
inglesa já tinha sucumbido, e uma nova hegemonia estava em aberto, uma vaga revolucionária
sacudiu a Europa - Espanha, França e Alemanha - e a crise mundial favoreceu o
surgimento de governos que buscavam uma margem de maior autonomia no sistema
mundial de Estados. Trotsky sugeriu o conceito de semi-bonapartismo ou
bonapartismo sui generis para explicar o governo Cárdenas. "Nos países
industrialmente atrasados o capital estrangeiro joga um papel decisivo. Por
isso, a relativa debilidade da burguesia nacional em relação ao proletariado
nacional. Isto cria condições especiais para o poder estatal.O governo oscila
entre o capital estrangeiro e o capital nacional, entre a relativamente débil
burguesia nacional e o relativamente poderoso proletariado. Isto dá ao governo
um carácter bonapartista sui generis, de tipo particular. O governo se eleva,
para tentar descrevê-lo, por cima das classes. Na realidade, pode governar
convertendo-se em instrumento do capital estrangeiro e submetendo o
proletariado com as cadeias de uma ditadura policial, ou manobrando com o
proletariado, chegando inclusive a fazer-lhe concessões, ganhando deste modo a
possibilidade de dispor de certa liberdade em relação aos capitalistas
estrangeiros." (tradução nossa)[2] O conceito de bonapartismo é
especialmente complexo porque questiona a idéia simples de que haveria uma
correspondência direta entre as classes e o Estado. Surgiu no marxismo para
tentar explicar governos nos quais o Estado arbitrava entre diferentes classes
proprietárias, apoiando-se em setores não proprietários. Napoleão III teria se
apoiado no campesinato para isolar o proletariado, e mobilizar sob a bandeira
da unidade nacional a favor do mundo das finanças, e Bismarck fez concessões ao
nascente proletariado, para manobrar contra a burguesia dos principados
ocidentais anexados a favor dos junkers do Leste. Adaptado à experiência de um
país semi-colonial, e reformulado como semi-bonapartismo para definir o governo
Cárdenas, que suspendeu o pagamento da dívida externa, e realizou uma reforma
agrária, reconhecendo os ejidos - a posse de terras comunitárias - procurava
explicar o alcance de uma política nacionalista que se apoiava nas classes
populares, arbitrando novas condições com o imperialismo, ainda nos limites do
capitalismo. Mas, Lula não é Chavez, nem sequer um Cárdenas do início do século
XXI. Na política, como na vida, o que não se enfraquece, se fortalece. O
governo Lula só poderia se fortalecer, nas atuais circunstâncias, se desse um
giro à direita mais anti-popular, abraçando o plano de um superávit nominal
zero, ou seja, um arrocho próximo a 10% do PIB para o pagamento dos juros. Um
governo Lula/Delfim Neto seria, no entanto, para os trabalhadores e o povo uma
catástrofe nacional. Um governo Lula mais fraco é, portanto, muito melhor que
um governo Lula forte. E, sendo possível mobilizar para derrubá-lo, não haveria
porque hesitar, mesmo se hoje não podemos vislumbrar a possibilidade da luta
direta pelo poder pelas forças anti-capitalistas. Um governo Alencar seria
ainda mais frágil. Já a antecipação do calendário eleitoral exigiria um enorme
grau de improviso por parte da burguesia que não tem candidatos fortes - tanto
PSDB quanto PFL têm contas a explicar - e diminuiria em muito as possibilidades
de um PT reciclado com outro candidato, abrindo espaço para uma recomposição da
esquerda sobre novas bases políticas e metodológicas. Uma candidatura de
esquerda socialista, construída tanto de baixo para cima pelo sindicalismo
classista, pelos ativistas independentes do movimento popular e estudantil,
quanto por uma articulação madura e paciente do PSTU, PSOL e Consulta Popular
com um programa anti-imperialista e anti-capitalista, poderia ser o início de
uma nova etapa da esquerda, sobretudo, se forjada a partir de uma experiência
de frente única na luta contra o Governo Lula. Tarefas democráticas e revolução
socialista Muitos socialistas honestos se perguntam se a denúncia da corrupção,
uma bandeira democrática, não deveria ser secundarizada porque, afinal, a
prioridade de uma política de esquerda precisaria ter como identidade
fundamental a apresentação, diante de todos os grandes acontecimentos, de uma
saída de classe, portanto, anti-capitalista. Esta discussão tem duas dimensões,
uma programática e outra ética. A dimensão programática é a compreensão que o
programa da revolução socialista deve assumir, conscientemente, tarefas
democráticas. A revolução social anti-capitalista contemporânea tem sido um
processo de simultaneidade de várias revoluções. Sobre esta questão
programática existiram duas posições simétricas, no passado, ambas equivocadas.
A primeira e mais influente foi a do PCB que defendia que, sendo o Brasil um
país atrasado em relação aos centros capitalistas, a revolução brasileira seria
uma revolução nacional e democrática, tendo como centro um programa de
industrialização e crescimento econômico. A etapa democrática era apresentada
em oposição a uma ruptura socialista e, por isso, foram criticados,
corretamente, como etapistas. Os sujeitos sociais interessados nesse programa,
segundo a direção liderada por Prestes, seriam a burguesia industrial aliada às
classes médias urbanas. Ficava reservado aos trabalhadores e ao povo pobre da
cidade e do campo um papel de pressão sobre uma fração das classes
proprietárias contra outras, sacrificado sua independência política. Esta
elaboração explicava a seguidismo político do PCB face ao governo Jango. A
outra posição, que influenciou a Polop, reconhecia que o Brasil era um país
retardatário em que as tarefas agrárias, de distribuição da propriedade da
terra, por exemplo, estavam pendentes, mas afirmava que, sendo o conflito entre
capital e trabalho o mais agudo e ordenador de todas as outras lutas, a
revolução brasileira seria socialista, ponto, e o seu sujeito social seria o
proletariado. A história provou que ambas estas elaborações eram unilaterais, ou
estavam diretamente erradas, mesmo se admitirmos, por justiça intelectual, que
a primeira se demonstrou mais equivocada. Nos países periféricos como o Brasil,
acompanhamos um processo de luta social em que as tarefas democráticas,
historicamente burguesas, não puderam ser realizadas pelas classes
proprietárias. Mas, isso não significa que tenham perdido importância, e que
não haja uma revolução democrática por fazer, mesmo depois da queda da ditadura
há vinte anos atrás. Até hoje, o Brasil permanece com uma espantosa
concentração de terras em pouquíssimas mãos, enquanto milhões não têm terra
alguma. Até hoje, o Brasil continua com uma inserção dependente no mercado
mundial, exportando capitais através do pagamento da dívida externa, vendendo
muito barato suas matérias-primas, e comprando caro manufaturados e pagando
fortunas de royalties. Até hoje, vivemos em uma República que
não é república, devorada pela corrupção e pela impunidade, porque riqueza e
poder se protegem, reciprocamente, e a lei está muito longe de ser igual para
todos. Isto foi assim e permanecerá assim, porque as classes proprietárias
temem, acima de tudo, a mobilização independente das massas trabalhadoras da
cidade e do campo. A revolução brasileira será, portanto, um processo de simultaneidade
de várias revoluções, como tem acontecido, aliás, nos últimos anos na América
Latina. O "que se vayan todos" da Argentina em 2001 e do Equador em
2005, expressava a radicalidade democrática do programa que permitiu a aliança
do mundo do trabalho com as classes médias. O que pretendia traduzir? As massas
estavam votando com os pés, marchando aos milhões, e dizendo que os políticos
profissionais burgueses e seus aliados reformistas não deveriam poder mais se
candidatar. Por isso, eram "escrachados" e desmoralizados, e não
podiam mais sair de casa. Na Bolívia, a bandeira de luta contra a violenta
repressão que deixou dezenas de mortos, e que levou à queda do "El
Gringo" Gonzalo de Losada em 2003, e a bandeira do "Gás é
nosso", que levou á derrubada de Mesa em 2005, traduziam a união das
reivindicações nacionais anti-imperialistas com a justa ambição democrática de
justiça para a maioria da população que é indígena e camponesa, e que sempre
foram considerados pelos proprietários descendentes de europeus, como
bolivianos de segunda classe. Os Fevereiros recorrentes latino-americanos desde
2000 - Equador em 2000 e 2005, Argentina em 2001, Venezuela em 2002 Bolívia em
2003 e 2005, as revoluções democráticas que permanecem incompletas, que
derrubam governo atrás de governo, mas não se colocam a questão do poder,
confirmam que processos de revolução socialista, mesmo se partindo de níveis de
consciência e organização insatisfatórios, estão em marcha. A revolução
brasileira não será diferente. Será um processo de mobilização em permanência
em que às bandeiras de luta anticapitalista, como a nacionalização do sistema
financeiro, por exemplo, se unirão as bandeiras democráticas radicais como a
luta contra a corrupção, pelo fim dos sigilos bancários, fiscais e telefônicos
dos corruptos e corruptores, pela expropriação de seus bens, pelo fim dos
paraísos fiscais, etc... Será uma revolução nacional contra o imperialismo, uma
revolução agrária contra o latifúndio, uma revolução democrática contra a
corrupção, uma revolução negra contra o racismo. Será, contudo, uma revolução
socialista, porque terá nos trabalhadores assalariados, a coluna vertebral da
aliança popular com as camadas médias, e não se deterá diante da propriedade
privada do capital. O fenômeno do substitucionismo social já adquiriu formas
incríveis - como revoluções agrárias que se desdobram em socialistas como na
China - e preparemo-nos para novas surpresas: tarefas democráticas elementares,
até republicanas - como aprecia tanto a esquerda petista - só poderão ser
realizadas com métodos revolucionárias, pelas classes que têm interesses
anti-capitalistas. É a revolução permanente. Os fins e os meios A dimensão
ética remete à relação entre os fins e os meios, que injustiçou no passado
remoto os jesuítas - e no século passado os bolcheviques - e encontrou seus
ecos no movimento socialista. O debate sobre estratégia e tática, qualificando
os diferentes tempos da política, deu uma nova vida ao problema, na medida que
crescentemente, a maioria das correntes que se reivindicaram socialistas no
século XX, foram abandonando a perspectiva anticapitalista, adotando diferentes
variantes de programas reformistas. Estabeleceram-se em relação ao tema, grosso
modo, três posições fundamentais na esquerda contemporânea, embora com nuances
intermediárias:(a) a posição que defende que os fins justificam os meios. Os
seus defensores argumentaram que, ao final, com a perspectiva do tempo, seriam
absolvidos. As sociais democracias francesa e alemã justificaram os genocídios
da Primeira Guerra, esgrimindo que agiam em cumplicidade com suas classes
dominantes, em nome da defesa da pátria. O estalinismo não hesitou, por
exemplo, em defender até o pacto Ribbentrop/Molotov, ou seja, aceitou um acordo
diplomático com o nazismo que não impediu que, dois anos depois, a URSS fosse
invadida por uma Alemanha imensamente fortalecida. Os "realistas" se
esquecem, porém, que meios indignos distanciam ou até comprometem os fins,
porque os fins precisam, também, ser permanentemente, reafirmados, confirmados
e justificados. Cometem, em nome do realismo político, o erro simétrico dos
moralistas. Mas, dividem com eles o critério absurdo de que meios e fins
independem uns dos outros;
(b) a posição dos
moralistas que os meios são tudo, e os fins, nada.Afirmada, originalmente, pelo
reformismo "a la
Bernstein ", virou uma coqueluche internacional com o
crescimento dos Forums Sociais Mundiais e a popularidade das ONG's. A
estratégia da luta se esgotaria na tática, esvaziando a política de invenção.
Porque tudo são táticas que, erraticamente, se sucedem. Não há horizontes, não
há projetos, não há programas. A política fica reduzida ao tempo do presente. A
dimensão utópica do combate socialista, que só pode adquirir significado na
revolução mundial, se perde. A história, de processo de vir a ser, passa a ser
um eterno presente, comprometendo, portanto, uma perspectiva de luta pelo
poder. Esta posição aparece, freqüentemente, camuflada com o argumento
empirista de que o caminho se constrói caminhando, cuja conseqüência é a
absolutização de critérios morais imperativos e universais. No limite, consiste
em uma subordinação da política à moral, uma versão que pode ser mais ou menos
laicizada (sob a forma de valores ahistóricos da "natureza humana").
Remete, em última análise, ao princípio teológico de que a moral independe da
história, portanto, da sociedade e dos conflitos de classe no seu interior.
Sendo os imperativos categóricos kantianos inaplicáveis, tanto sob as pressões
da vida cotidiana, quanto na arena das lutas de classes quando esta se
exacerba, os valores morais universais passam a ser um princípio sagrado
irrevogável, porém inútil;
(c) a posição que
defende que os meios e os fins têm entre si uma relação indissolúvel e, em uma
sociedade dividida, o combate político é também um combate moral. Só seriam
admissíveis, portanto, aqueles meios que estejam ao serviço da supressão do
poder de uma minoria sobre a maioria: os meios que inflamam a indignação dos
oprimidos, que exaltam a sua união e confiança em si mesmos, que confirmam a
justeza de suas lutas. Obrigatório concluir que nem todos os meios são
permissíveis. Devem ser condenados como indignos, por exemplo, todos os
procedimentos que alimentem ilusões nos inimigos de classe e desconfiança entre
os trabalhadores; os métodos dos burocratas que trocam confidências com os
patrões e mentem, descaradamente, para as suas bases; os artifícios dos que
lançam um setor do povo oprimido contra outros; ou que estimulem o seguidismo
cego dos chefes; e, acima de tudo, o repugnante servilismo diante das
autoridades, e o correspondente desprezo pela juventude e os explorados e suas
opiniões; mas, reconhece, também, que não existe um catecismo que defina como
mandamentos o que é consentido, e o que é impensável.
Valerio Arcary,
professor do CEFET/SP, é autor de As Esquinas Perigosas da História, situações
revolucionárias em perspectiva marxista. Foi membro do Diretório Nacional do PT
a partir de 1987, e da Executiva Nacional do PT a partir de 1989. Foi expulso
do PT no processo de exclusão da Convergência Socialista em 1992.